Do original em http://www.estadao.com.br/saude/noticias/materias/2006/jul/07/74.htm
São Paulo - Em fevereiro, a agência do governo dos EUA responsável pelas pesquisas médicas (NIH, na sigla em inglês) reconheceu formalmente a meditação como prática terapêutica que pode ser associada à medicina convencional. Em maio, o Ministério da Saúde brasileiro baixou uma portaria em que incentiva postos de saúde e hospitais públicos a oferecer a meditação em todo o País.
Recentemente, o instituto NCCAM (National Center for Complementary and Alternative Medicine), órgão ligado NIH (National Institutes of Health), similar ao Ministério da Saúde do Brasil, publicou um estudo com a posição oficial da entidade sobre a meditação. A técnica foi classificada como um procedimento de saúde. Para formular a tese, o órgão consultou diversos artigos médicos no mundo e incluiu o trabalho de pesquisadores da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) que define operacionalmente a meditação.
O dr. Roberto Cardoso, autor do livro Medicina e meditação – Um médico ensina a meditar (MG Editores), é um dos responsáveis pelo artigo da Unifesp. “É um ganho memorável para um grupo latino que consegue cunhar um artigo conceitual em saúde. Esse estudo deve nortear o conceito de meditação em novos trabalhos sobre o tema no futuro”, afirma. Para Cardoso, a meditação começa a trilhar os passos da acupuntura no sentido de se tornar um recurso terapêutico reconhecido pela classe médica. Desde 1979, a OMS (Organização Mundial da Saúde) estimula o uso da acupuntura no mundo.
Em sua terceira visita ao Brasil, em abril deste ano, o líder espiritual tibetano Tenzin Gyatso, o dalai-lama, defendeu mais pesquisas sobre o uso da meditação na saúde. Durante seminário no Palácio de Convenções do Anhembi, em São Paulo, ele falou sobre compaixão, ciência e espiritualidade a um público de quase 4 mil pessoas, entre elas médicos e professores.
“Pesquisas investigam qual parte do cérebro é ativada quando se faz meditação unidirecionada, meditação baseada na compaixão ou meditação com ausência de pensamentos. Os neurologistas têm descoberto conexões interessantes entre esses diferentes estados mentais”, disse o dalai-lama.
Em novembro do ano passado, em Washington, o Dalai Llama abriu o mais prestigioso congresso de neurocientistas do mundo, o Neuroscience. Diante de 14 mil pesquisadores do cérebro, ele discorreu sobre as práticas de meditação tibetana e suas virtudes terapêuticas. Foi a senha para que, também no Brasil, acontecesse o encontro improvável da religião com a ciência. No dia 28 de abril de 2006, uma sexta-feira, a Universidade Federal de São Paulo co-realizou o seminário "Compaixão e Sabedoria - A Construção da Saúde Pessoal e Coletiva".
Oito pesquisadores e professores da universidade foram os interlocutores do Dalai Lama em outras duas sessões: "Mente e Coração Abertos" e "Ciência e Espiritualidade".
Nos Estados Unidos, o convite ao Dalai Lama para abrir o congresso científico rendeu polêmica. Pesquisadores (a maioria de origem chinesa) chegaram a cancelar sua participação no evento, alegando a impropriedade de misturar ciência e fé.
Criticaram o diálogo fraterno com o budismo, comparando-o à execração dos meios científicos com as teorias criacionistas, que possuem inspiração evangélica. Por que então dois pesos e duas medidas?
Assim o próprio Dalai Lama respondeu, durante a sua fala no Neuroscience: "Ao nível filosófico, tanto o budismo quanto a ciência moderna questionam qualquer noção de absoluto. Tanto o budismo quanto a ciência preferem explicar a evolução e a emergência do cosmos e da vida em termos de uma complexa inter-relação das leis naturais de causa e efeito".
Segundo a pesquisadora Elisa Kozasa, 37, do Departamento de Psicobiologia da Unifesp, a atual é a segunda onda de simpatia dos cientistas com a técnica oriental da meditação: "A primeira veio nos anos 70, no rastro da contracultura, quando a medicina tibetana era chamada de alternativa."
Segundo o professor José Roberto Leite, também da Unifesp e praticante da meditação, a técnica conseguiu se incorporar ao arsenal terapêutico disponível para o tratamento de problemas como hipertensão, depressão ou pânico. "Está provado que funciona. Em vez de "alternativa", fala-se, agora, em "medicina integrativa" ou complementar."
É uma grande diferença. Antes, havia uma guerra de princípios opondo os alternativos e a academia. Hoje, é possível acender um incenso ao deus Prozac enquanto se medita em busca do equilíbrio perdido. Ah, também cabe uma terapia para quem quiser.
O uso de plantas medicinais, homeopatia, medicina tradicional chinesa (MTC) - acupuntura, termalismo (uso de águas minerais) e de outras práticas terapêuticas alternativas está autorizado nas unidades no Sistema Único de Saúde (SUS). O Ministério da Saúde (MS) normatizou, por meio da Portaria 971 de 3 de maio de 2006, do Ministério da Saúde, publicada na Edição 84 de 04/05/2006 do diário Oficial da União, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde.
Dentro da medicina tradicional chinesa (MTC), a portaria cita:
Ítem 1.1 (…) A MTC inclui ainda práticas corporais (Lian Gong, Ch'i Kung, Tuina, Tai Chi Ch'uan); práticas mentais (meditação); orientação alimentar; e o uso de plantas medicinais (fitoterapia tradicional chinesa), relacionadas à prevenção de agravos e de doenças, a promoção e à recuperação da saúde. (…)