Nós, pais, vivemos sempre o apuro de educar, pois não fomos educados para educar nossos filhos. A maioria de nós não fez um curso de “novos pais”. Não é porque nos tornamos pais que ganhamos a credencial de educadores de nossos filhos. Na maioria das vezes nos tornamos“deseducadores” deles. A educação deles nunca é pautada em conhecimentos adquiridos e, sim, baseada no instinto ou na mera repetição da educação que recebemos de nossos pais. Intuimos que a verdadeira educação deve incluir ética, cidadania, disciplina, gratidão e espiritualidade, pois são valores que, na vida cotidiana, podem ser passados e exigidos dos filhos.
Mas a quem é delegada a tarefa de educar. Até a pouco tempo atrás, à mãe cabia essa tarefa, mas o cotidiano atribulado da mãe, que saiu de casa em busca de “igualdade” com o pai, fez com que essa tarefa fosse delegada a terceiros. Hoje, ao colégio, à babá ou ao responsável pelo reforço escolar, cabe a tarefa de “educar” nossos filhos. Eles terminam recebendo, sendo otimista, conhecimento e não a verdadeira educação. Confia-se que o colégio tem toda a preparação para educar nossos filhos. E eles crescem e nós não percebemos.
Nossos pais foram duramente criados, uma educação altamente repressora na qual bastava o pai olhar para os fazerem tremer: a geração dos reprimidos. O pensamento “se eu fui reprimido então não vou reprimir” faz surgir uma geração de crianças que têm tudo que o pai não pôde ter. Para compensar a educação repressiva que tiveram na infância e na adolescência, muitos pais acabam se tornando extremamente permissivos com os filhos e dessa forma não os estão educando, pois um filho precisa ter limites.
A educação deve sempre visar o que o filho precisa. Içami Tiba, psiquiatra, afirma que o filho precisa ganhar o presente que pode absorver e não o que os pais podem dar, senão a criança troca de foco:o prazer passa a ser ganhar brinquedos e não curtir o que ganhou . As crianças hoje são chantagistas e imperiosas, extorquem os pais para ter mais um cartucho de videogame, para conseguir o segundo brinquedo do mês, mais uma fivela para o cabelo, mais uma caneta para o seu estojo, a ficha para o brinquedo do Shopping, mais dinheiro para o lanche, a saída para um fast-food, etc..
Se damos tudo aos nossos filhos, estamos os educando mal, porque o mundo não dará tudo a eles. Eles acabarão, como adultos, se encostando em alguém que continuará dando tudo a eles e viverão sua vida adulta dependentes de alguém para viver, parasitas de seus cônjuges, amigos ou sócios. Precisamos dar-lhes o poder interior da realização, fazer com que confiem em si mesmos e criem auto-estima.
É imenso erro fazer tudo para os filhos em nome do amor, pois só se aprende a fazer, fazendo. Não é poupando o filho de seus erros que ele aprende a não errar. Quando o filho aprende com o erro, aquele erro foi bom para ele, não existe a segurança de acerto eterno. Na vida, sempre estamos errando para poder traçar o nosso caminho. ParaPiaget, a criança cria e recria, continuamente, seu modelo de realidade à medida que sua evolução mental progride até a fase adulta.
Ser pai ou mãe é a arte de dizer “não” e “sim” na hora certa. Não devemos ser repressivos nem liberais. Desperdiçamos muitos “nãos” com frivolidades e os “nãos” essenciais são desobedecidos. A frase”sou seu pai (mãe) e você tem que me obedecer” não funciona mais, pois nossos filhos querem os porquês. Devemos falar menos “não”, mas quando o falarmos, nós deveremos ser obedecidos, pois isso cria um padrão. A criança que sabe o que pode e o que não pode, vive muito melhor do que aquela que “tudo não pode” ou “tudo pode” – ela não tem parâmetros.
Ser pai ou mãe é a arte de se tornar desnecessário, já dizia Roberto Shinyashiki. Amor produz liberdade. Devemos dar a liberdade de nossos filhos resolverem os seus próprios problemas, que assumam a responsabilidade por seus atos, e isso se vê claramente no seu convívio com os coleguinhas. Devemos auxiliá-los a desenvolver o potencial para enfrentar os momentos desfavoráveis e não resolver os seus problemas. Devemos orientá-los e apoiá-los para que aprendam a confiar em si próprios, e ter consciência de que se for necessário para seu desenvolvimento que eles errem, então que os deixemos errar. Criar sua auto-estima é ensinar-lhes a dar o melhor de si e não aceitar que “menos mau” seja sinônimo de bom. Dizer “pelo menos passe de ano” é inadimissível.
Mas geralmente metemos os pés pelas mãos e usamos de nossa autoridade para mandos e desmandos, “nãos’ inexplicados, carinhos não concedidos e castigos absurdos. Descontamos em indefesas crianças nossos traumas infantis e acabamos repetindo erros que foram cometidos conosco quando éramos crianças. Geramos feridas emocionais em nossos filhos.
Crianças... Adultos.../ Amor... Ódio.../ Sonho... Realidade.../ Inocência...
Freud nos trouxe a noção de que é quando crianças que apreendemos todos os nossos medos, culpas e complexos. Formamos a nossa personalidade através de nossas experiências com o mundo externo. Assim somos um misto de frustrações e conquistas que nos sacode o interior. Mas por que é assim?
O nosso processo de autoconhecimento começa na mais tenra idade, quando começamos a perceber o nosso corpo, as pessoas à nossa volta, nossos brinquedos e todos os estímulos sensitivos que nos chegam pela porta dos nossos sentidos. Freud afirma que a vida infantil é regida exclusivamente pelo Princípio de Prazer. Crianças, quando o nosso ego personalístico ainda está em desenvolvimento, temos a sensação de infinitude e perfeição que buscamos no nosso mundo finito e imperfeito de matéria, inclusive em nossos pais, aos quais cobramos essa perfeição. A criança exige dos pais um amor incansável, uma firmeza psicológica inabalável e uma conduta moral perfeita e perene. Daí advém o nosso primeiro trauma e conseqüente ferida no “corpo emocional”: nossos pais e nós mesmos somos seres humanos imperfeitos.
Um simples “não” pode causar uma ferida emocional imensa na criança, e causar conclusões absolutamente absurdas, mas perfeitamente admissíveis na mente infantil. Essas conclusões, provindas de quando éramos criança, uma criança que quis perfeição e felicidade absoluta, mas que só encontrou privação, insatisfação e frustração, geramImagens congeladas que ficam registradas no nosso subconsciente. A Imagem da frustração, da insatisfação e da privação.
A essa época, começamos a esquecer o nosso autoconhecimento e a nos guiarmos, como autômatos, por nossos hábitos e mecanismos de defesa. Assim, nossas reações emocionais, geralmente, são fruto de condicionamentos criados ao longo da vida, baseados num tipo de lógica limitada e errônea que é própria de nossa dimensão emocional. Esses condicionamentos são conclusões infantis subconscientes que governam a nossa vida consciente inundando-a de desejos, repulsas, ódios e paixões.
Por exemplo, quando crianças podemos ter sido obrigados a agredir a quem amamos, como forma de chamar a atenção e conseguir uma demonstração de amor delas, nem que seja a atenção delas na hora de repreender. Podemos ter sido obrigados a esconder os nossos erros para obtermos o amor e a admiração daqueles a quem amávamos. Com o tempo, passamos a ser sádicos e agressivos sem sabermos os por quês. Passamos a ser arrogantes e a mostrar a todos que nunca erramos, para podermos ser amados e admirados. Adultos, somos crianças ainda e continuamos agindo segundo nossos hábitos e mecanismos de defesa, procurando contato com o que nos dá prazer e fugindo da dor.
“Você culpa seus pais por tudo. Isso é um absurdo. São crianças como você. O que você vai ser quando você crescer”.
Renato Russo – cantor brasileiro
Levamos para a vida adulta atitudes infantis viciadas, Sombras disfarçadas com Máscaras. Uma Máscara de “bonzinho”, que esconde uma pessoa vingativa que acha que assim despertará o amor daquele que ele ama. Uma Máscara de perfeito e impecável que esconde uma Sombra arrogante que quer a admiração daqueles que ele ama. O ascetismo espiritual quase sempre nos afasta dessa criança e de seus mecanismos. A verdadeira busca pelo autoconhecimento, verdadeiro gerador da auto-estima, não deve prescindir o conhecimento desses mecanismos infantis. A energia gasta pela nossa negatividade, que deve ser oculta pelas suasMáscaras, e a energia represada que constitui nossa Sombra, devem ser liberadas, conhecidas e reintegradas, para que possamos, inteiros, sermos livres.
Caminhar inteiros significa não ter que parar porque algum fator cotidiano disparou mecanismos infantis de raiva ou frustração, que vêm à tona quando menos esperamos. Só quando vemos e sentimos que esses mecanismos não funcionam mais e trazem apenas sofrimento, é que conseguimos vencer os nossos sentimentos mesquinhos e inferiores. Deixamos de ser adultos e voltamos a ser aquelas crianças que buscavam perfeição em tudo, novamente inocentes, mas vividos, novamente sonhadores, mas realistas, novamente amorosos, mas sábios, usando a negatividade quando deve ser usada, pois são das crianças o Reino dos Céus.
Nas palavras de Miklos Burger, fundador do Instituto Transpessoal de psicologia: “nas entrelinhas de nossa conversa vazia, nas metáforas doídas de nosso corpo cansado, a preciosidade maior, a luz de nossa vida. Ela está lá, esperando, onde o tempo não importa, congelada, travada e travando. É preciso ir a ela. Reconquistar sua confiança. Falar-lhe em termos que ela possa compreender. Estender-lhe a mão para que ela possa ver que o tempo passou, e que sobrevivemos. Ela mesma encontrará uma saída. Não mais nos atormentará. Para que? Seguiremos juntos, de mãos dadas, trilhando a doce trilha da liberdade”.