Conhecido e praticado milenarmente na Índia (yoganidra), o relaxamento é a porta de entrada a todos os estados ampliados de consciência. Sabe-se hoje que o que o relaxamento total só é possível quando se consegue um total relaxamento dos músculos da face, principalmente os da testa. O treinamento em relaxamento muscular é um treinamento em volição passiva (Cf. em “A ENERGIA MENTAL”, no capítulo anterior). É um querer e deixar a coisa acontecer. Sabe o que é isso quem consegue boiar o corpo inteiro na água. Se forçar não consegue. Se houver entrega, acontece.
Baseado nesse princípio e influenciado pela filosofia Yoga e por técnicas de hipnose, o neurologista e psiquiatra alemão Johannes Heinrich Schultz (1.884-1.970) desenvolveu uma técnica, popularizada na Europa por volta de 1.910 com o nome de “relaxamento autógeno” 44:110, que tem como objetivo produzir os estados de relaxamento que possam levar ao transe e/ou à hipnose, ou até mesmo facilitar estes estados. Nessa técnica de concentração passiva, na medida que o indivíduo relaxa, aumenta a possibilidade de focalizar a atenção.
Ele notou que pacientes hipnotizados sentem o corpo mais pesado e uma sensação difusa de calor que associou a relaxamento muscular e vasodilatação periférica. Daí inferiu que se poderia ensinar aos pacientes como produzir voluntariamente em si mesmos essas sensações e, conseqüentemente, seus efeitos na mente.
Assim, ensinava a seus pacientes a induzir passivamente, em si mesmo, uma sensação de peso ou calor no corpo, mediante a concentração em partes do corpo, na freqüência dos batimentos cardíacos e na respiração. Como auxiliar no processo hipnoterapêutico, seu mecanismo de ação se dava pelo desbloqueio muscular e liberação do conteúdo do campo emocional, facilitando a auto-expressão e o auto-esclarecimento, e possibilitando pensamentos específicos que poderiam provocar mudanças e aberturas a novas possibilidades.
O estudo científico sistemático do relaxamento iniciou-se a partir do trabalho do Dr. Edmund Jacobson (1.920), psicofisiologista da Universidade de Harvard. Com a ajuda do eletroencefalograma (E.E.G.) e do eletromiograma foi possível avaliar a relação direta entre impulso cerebral e tônus muscular. Assim notou que o pensar em um ato motor provocava potenciais de ação elétricos musculares mensuráveis, na independência de haver movimento ou não. Em sua pesquisa científica, ele utilizou esta ligação concluindo que “a cada reação emocional corresponde uma tensão muscular” que altera os ritmos cerebrais.
Nervosismo, emoções, etc., estariam relacionados com padrões de contração muscular transitórios e, assim, o relaxamento muscular progressivo de zonas corporais acarretaria um repouso correspondente no Sistema Nervoso Central. Fisiologicamente se sabe que a Formação Reticular, que integra e participa no controle da atividade motora, emocional e autonômica, é sobrecarregada quando ocorre uma alteração nos estados emocionais e gera um ciclo vicioso que mantém ou aumenta as tensões e desequilíbrios emocionais.
Quando se introduz o relaxamento muscular progressivo, desfaz-se esse ciclo vicioso da tensão que se retro-alimenta a si mesma, pela diminuição do estímulo na Formação Reticular. Inaugurou-se, assim, o uso de aparelhos na demonstração de que a psique altera o corpo.
O relaxamento muscular progressivo de Edmund Jacobson é uma técnica de contração e relaxamento muscular que abrange cerca de 30 grupos musculares e utiliza principalmente a respiração. Quando inspiram, seus praticantes tencionam os músculos e os distendem por cerca de cinco segundos. Ao expirar, eles os relaxam. Essa alternância faz com que o cérebro produza mais serotonina e endorfinas, neurotransmissores que propiciam a sensação de bem-estar. Ocorre uma melhora na imunidade e leva a um desbloqueio muscular e psicológico, um estado de equilíbrio interno ou de funcionamento natural do binômio corpo/mente. É a condição de descanso ideal.
Em 1.973, Edmund Jacobson fundou a International Stress Management Association (ISMA), hoje presente em 13 países, visando contribuir para a redução de doenças decorrentes do stress e uma melhor qualidade de vida em todo o mundo. A ISMA se empenha em estimular os profissionais da área e o público em geral a utilizar apenas as técnicas de relaxamento que preencham critérios científicos e tenham validação clínica. Só com o relaxamento profundo diversos pacientes portadores de doenças como cefaléias crônicas (enxaquecas), artrites, síndrome do cólon irritável e fibromialgia (um tipo de dor crônica muito associado a disfunções psíquicas), obtêm, em média, 90% de melhora.
Uma prática muito simples pode ilustrar o bem-estar que o relaxamento pode trazer ao corpo. Se deitarmos em algum local silencioso, relaxarmos nossos grupos musculares, um a um, da região inferior até a superior (com atenção especial ao períneo, aos ombros e aos músculos da região frontal, maxilar, boca e garganta), deixando o nosso corpo como que afundar no chão, ou colchão, e simplesmente nos concentrarmos no ato simples de respirar, observando e sentindo o ar entrando e saindo das narinas, por um ou dois minutos, veremos a calma e a paz que sentiremos, como se tivéssemos acabado de acordar de um sono profundo e revitalizador. Mas também veremos o quanto é difícil manter a mente concentrada ininterruptamente por apenas alguns segundos. Veremos a força invisível dela buscando a distração em sensações, pensamentos e sentimentos, buscando viver ou no passado ou no futuro. Ela foge do presente que é simplesmente observar o respirar.
Mas as artes marciais ensinam uma forma diferente de relaxamento, um relaxamento dinâmico, que faz com que surja movimento livre de tensões. É um mover-se quase sem força muscular, mas com o poder da força vital que emana do Hara, que é o nome japonês dado à região abdominal inferior (Cf. no capítulo anterior em “A INTENÇÃO E A DIMENSÃO HÁRICA”). Quando se focaliza a mente no centro do Hara (cerca de 3,5cm abaixo da cicatriz umbilical) e se relaxa o corpo de todas as tensões, os movimentos corporais surgem livres, o corpo se torna flexível, mas firme e a mente, também, se torna livre de tensões e flexível: põe-se apta a criar livremente.
Nesse estado de relaxamento dinâmico, sem tensões sobre os ombros, sobre o pescoço e muito menos sobre a região frontal (a testa), com a concentração na respiração presente no Hara (respiração abdominal), se experimenta um estado de calma atenção e descanso muscular, embora em movimento.