A Balada da Vida

Ao descortinarmos as nuanças dos amanheceres podemos sentir os rios da vida percorrendo as fibras do nosso ser. Os ventos da manhã nos saúdam entusiastas e o êxtase da esperança nos abraça com força. Como é bom insuflar os amanheceres! Como é bom viver! A sensação de alegria que ora ou outra nos acomete é um bálsamo aos nossos sofreres, agindo como escape às amarguras canalizadas nos labirintos d’alma.

Rodopiam os ventos ao labor dos balés sazonais! As forças da natureza nos revelam que apesar das tormentas a nós impingidas pelo destino, sempre novos sonhos e novas esperanças far-nos-ão seguir adiante. Sim, e eis lá horizonte! Eis lá o reconhecimento do nosso trabalho, da nossa luta, da nossa afoiteza de viver! Usufruímos em era hodierna de inacreditáveis maravilhas tecnológicas porque em outras eras, homens extraordinários as vislumbraram e deram o sangue por elas. Sabiam eles que não desfrutariam do que ora desfrutamos, mas sabiam que os seus digníssimos sucessores viveriam num mundo fantástico. E vivemos mesmo!

Um dia também seremos ancestralidade e vivamos de forma tal a deixarmos como herança aos nossos sucessores um legado de honra. Destarte nos fortalecemos mais e mais, posto que viver seja sublime benção. Sofremos dores muitas, é bem verdade, e daí? Somos agraciados com dias que reforçam a nossa proeza de viver, a nossa beleza de ser, não somos? Tudo morre, mas tudo nasce; choramos, mas também sorrimos; perdemos, mas também ganhamos. Viver é sentir todas as emoções, viver é ter fé, viver é abençoar a vida, viver é dar bom dia ao dia todos os dias.

Viver é cumprir com as nossas obrigações biossociológicas sem interesse escuso; trabalhar, projetar, criar, praticar alquimia para preencher o tempo da nossa vida linda. Investir num projeto, numa pesquisa, numa ação, suportar com dignidade a caminhada árdua na avenida das dificuldades das tensões e frustrações do dia a dia. Viver é fascinar-se com todos os seres, com suas ações e reações; fascinar-se com a pedra, com a água, com a planta, com o animal, com tudo que canalize vida. Fascinar-se com o fascínio que sentimos uns pelos outros, fascinar-se com o inspira-expira, inspira-expira…, fascinar-se com o tum tum tum dos corações, fascinar-se com as tagarelices do cérebro.

Viver! Como é bom viver essa vida cheia de cores, de cheiros, de sabores, de amores, de ardores, de valores! Sim, muitos dos nossos sonhos jamais se realizarão, e daí? Somos detentores da felicidade, mas sabemos que surge o dia em que tudo desmorona. Conhece-se então a dor inaudita, a dor excruciante, conhece-se o sofrimento que parece não ter fim. Sim, a felicidade, quando a sentimos, é muito boa, mas há de ser açoitada por dias tormentórios para que possamos nos fazer melhores. Ninguém pode denominar-se o mais feliz dos mortais, haja sabermos que as alegrias da vida colidem com as tristezas da morte, amalgamando a nossa dor. E uma tristeza inaudita nos assola ao sabermos que de milhares de crianças e jovens lhos é tirado o direito de perpetuarem-se. Entretanto, acenam-nos novas gerações. Bebes fofésimos vingarão e conseguirão atingir a longevidade para acalentar nos braços os filhos dos filhos dos seus filhos.

Somos meio intransigentes, meio birrentos, meio intolerantes, somos sim! E somos brandura, amor, fraternidade, somos sim! Então, reverenciemos a nossa vida, reverenciemos a nossa bravura de viver. Contemplemos o céu estrelado e não desistamos da sensação inebriante de um coração que nos bate afoito no peito. Tum tum tum… inspira – expira… A balada da vida é deveras linda e emocionante. Ouçamo-la na tepidez das noites serenas, enquanto o silêncio dorme placidamente no aguardo dos sóis dos nossos amanheceres.

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