A Hora da Transição

Do original publicado no Jornal Diário do Nordeste
 

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O declínio de recursos fósseis não é o único desafio do século. A sociedade também enfrenta outros problemas como: o grande acúmulo de lixo e o consumo exagerado de carne. (Foto: Arquivo )

O filme “Home: Nosso planeta, nossa casa” (Europa Filmes, 2009), foi exibido, no começo do mês, na Casa José de Alencar, por ocasião do primeiro encontro promovido pela Rede Social “O Outro Brasil que Vem Aí: Comunidades em Transição para uma Sociedade Pós-Carbono”.

Trata-se de um documentário, realizado pelo fotógrafo francês, Yann-Arthus Bertrand, que percorreu de avião 54 países, registrando imagens aéreas de regiões do planeta destruídas. Bertrand objetivou tocar as pessoas para se unirem em prol da reconstrução da Terra a partir de novos paradigmas.

O encontro, que iniciou as atividades coletivas da Rede Social, foi coordenado pelo psicólogo e professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará, Francisco Cavalcante Júnior, e contou com participantes de diversas áreas, dentre eles, aprendizes da Universidade Holística (Unipaz).

 
Para o psicólogo, a matemática é simples, e já começa dentro de casa, em nossa própria comida, encharcada de óleo. Cita um levantamento elaborado pelo Oregon Dept. of Energy, que projetou o consumo indireto de um americano para ter alimento em seu prato ao longo de 12 meses de 1515 litros de combustível. Com 31% desse volume, gastos com fertilizantes, 16% em transporte, 19% em maquinário do campo e 13% em irrigação.

Ponto de mutação

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A questão ambiental perpassa por outras esferas sociais, com necessidade de ser revista pela ótica sistêmica (Foto: Arquivo )

“Se precisamos de combustível na realização de atividades básicas como alimentação e deslocamento (carros, ônibus), se as nossas trocas econômicas também precisam de transporte (marítimo, aéreo), se o nosso cotidiano utiliza-se fartamente dos derivados do petróleo (gás, plástico, pneus, borrachas, etc), uma crise na oferta de petróleo é também uma crise social e institucional”, reflete Cavalcante Jr.

No princípio dos anos 80 do século passado o físico teórico austríaco, Fritjof Capra, após manter diálogo aberto com cientistas e estudiosos de áreas diversas de todo o mundo, anteviu a crise que se instaurava como um desafio ímpar para a humanidade. Ele registrou suas reflexões e a necessidade urgente de mudança de paradigma em “O Ponto de Mutação” (Editora Cultrix), onde descreve como única a dinâmica subjacente aos principais problemas de nosso tempo (poluição ambiental, inflação, carência energética, poder nuclear, depressão, câncer, violência), a qual sinaliza termos chegado a um beco sem saída.

Energia limpa

Capra apontou para a mudança do paradigma cartesiano para o holístico, que estabelece uma visão sistêmica da realidade, a qual permite que as forças de transformação do mundo tenham fluência a um movimento positivo de mudança social. E, foi mais longe, ao fundar o Centro de Eco-alfabetização, nos EUA, para educar as pessoas para a sustentabilidade.

 
O professor Cavalcante Jr lembra o Dr. Marion King Hubbert, um geólogo da Shell, que bem antes de Capra – em 1956 – já apontava que os EUA teriam uma crise de saturação na oferta de combustíveis fósseis, somada à demanda de crescente industrialização/desenvolvimento por mais energia. “Hubbert tinha observado também que as reservas de petróleo alcançariam seu ponto máximo de oferta nos anos que seguissem a virada do século”, revela o coordenador da Rede Social.
 
A crise na saturação e declínio de recursos fósseis não é o único desafio desse século, sinaliza outro psicólogo e professor da Faculdade do Nordeste (Fanor), André Feitosa de Sousa, que realizou a abertura do evento na Casa José de Alencar.

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Uso do combustível fóssil esgota os recursos do planeta e exige mudanças 
 
Feitosa, Cavalcante Jr, Yuri Sales e Renan Brasil são integrantes da equipe gestora da Rede Social. Afirmam não ser mais possível prosseguir com condutas inconsequentes, respondendo apenas à saturação e declínio de combustíveis fósseis, com aumento de poluição. Como o caso das usinas à carvão e exploração de petróleo, em camadas mais profundas.

“Não há como desconsiderar as necessidades sociais e fazer de conta que não precisamos de novas matrizes de energia. Ou, pior, simplesmente desconsiderar que a mudança climática avança vertiginosamente, aproximando-se da fronteira do irreversível”, adverte Cavalcante Jr.

Consumismo e a carne

Infelizmente, a falta de consciência ambiental é algo sério em termos coletivos. O empresário e psicólogo Paulo Borges, diretor do Instituto Gaia e membro do conselho gestor da Unipaz (Ceará), presente ao evento da Rede Social, lembra que a Universidade Holística tem como princípio a visão sistêmica. Por isso, seus integrantes e aprendizes sempre se posicionam em favor de plantar as sementes para essa nova consciência em nosso planeta.

Há muitos aspectos da realidade que está sendo criada materialmente, a partir dos modelos vigentes, que não temos dimensão de suas repercussões. O que é lançado no ar e as radiações, os efeitos dos agrotóxicos e tudo o mais, não temos nem idéia do que ficará para as gerações futuras, sinaliza Paulo Borges, que elogia a iniciativa da Rede Social de não criar alarde, mas de apresentar esses importantes aspectos da realidade, a fim de tomarmos imediatamente ações concretas para revertermos o quanto antes a situação de risco.

Qual a razão que, mesmo sabendo disso tudo, ainda se produz mais, cria-se mais excedente, mais lixo? Cavalcante se refere ao consumo da carne, algo bastante grave. Isso porque um quilo de carne exige 15000 litros de água para ser produzido.

Os integrantes da Rede Social revelam como todos estamos colocando nossa geração (presente e futura) em risco de colapso social (ruptura político-institucional e quebra no tecido social) e colapso natural (fome e sede, desertificação, cataclismos naturais, extinção da fauna e flora). Garantem que os refugiados climáticos já são muitos e aumentarão nos próximos anos.

André Feitosa afirma não haver mais tempo para pessimismos. “Precisamos interromper já a destruição que o comportamento humano vem criando”.

A proposta lançada pela Rede Social é de mapear práticas já em andamento que facilitem a Transição para uma Sociedade Pós-Carbono, estimulando a saírem do emaranhado emocional e se posicionarem com prontidão para enfrentar esses novos tempos. Um consórcio acadêmico entre três Universidades, de três Países (Universidade de Toronto – Canadá, Universidade de Viena – Áustria e Universidade Federal do Ceará – Brasil) foi estabelecido e, no Brasil, esse projeto internacional será operacionalizado através de uma pesquisa-ação denominada: “O Outro Brasil Que Vem Aí: Comunidades em Transição para uma Sociedade Pós-Carbono”.

Novos encontros presenciais mensais da Rede Social acontecerão, assim como encontros virtuais e workshops que visam a troca de experiências para ações concretas conjuntas.

FIQUE POR DENTRO

Carbono liberado gera perigosos transtornos

Os refugos/resquícios da industrialização e poluição despejada na atmosfera alarma. A ordem do dia é desacelerar até parar a liberação do carbono.

O carbono esteve estocado nas árvores, hoje liberado através das queimadas. Ficou armazenado nas profundezas da terra, e agora é bombeado para a superfície, de forma constante, nas perfurações de petróleo.

Esse volume imenso de carbono é muito superior à capacidade da terra e seus ciclos de absorção, diz prof. Cavalcante Jr.

“O excedente de carbono, que fez da Terra um forno, está aumentando a temperatura ao reagir, por exemplo, com a camada de proteção externa do planeta”, justifica. E explica que o aumento da temperatura está levando picos e montanhas de neve eternas a diluírem-se de forma assustadora.

Mais informações
Contato com a rede social: relus01@gmail.com ou
http://www.outrobrasilquevemai.ning.com

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