Desligue a TV. Ligue-se na Vida

A TV é um entorpecimento físico e mental constante (Valdemar Setzer).
 
Duas experiências mudaram radicalmente a minha visão no que se refere ao uso de televisão, computadores e videogames, principalmente por parte de crianças. Uma delas foi a leitura do livro 'A criança e a TV', da médica e psicanalista argentina Raquel Soifer. A outra foi a leitura dos textos do professor Valdemar Setzer, que estãodisponíveis na internet para quem quiser consultar.
Não é de hoje que se suspeita que haja alguma coisa errada com a TV. O cronista Sérgio Porto, nos anos 60, referia-se a ela como 'a máquina de fazer doido' e o sociólogo Betinho a classificou como 'a mais fantástica máquina de imbecialização jamais criada'. Outro sociólogo, este norte-americano, Waldo Frank, disse que 'a TV está formando gerações de débeis'.

A médica Raquel Soifer, contudo, vai mais longe, ao afirmar que a TV cria problemas de dislalia, dislexia e disgrafia nas crianças. E mais: a TV narcotiza essas crianças, predispondo-as ao consumoposterior de drogas. Há no livro o depoimento de pesquisadores de MIT que afirmam categoricamente que 'as pessoas que, a partir dos anos 60, cresceram diante da TV, não tem a inteligência das mais antigas.' Eu imagino que isto seja verdade, quando comparo as crianças de hojecom as do meu tempo de garoto. Ressalto que falo com a visão de quem passou a infância e a adolescência em Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro, na década de 50. Naturalmente que os meninos de hoje sabem muito mais em matéria de sacanagem do que os da minha geração.

Em compensação, perdem de dez a zero em matéria de raciocínio lógico, inteligência e cultura. Eu só tenho uma explicação para isso: o longo tempo que elas permanecem em frente a TV e vídeo games. Naturalmente que algumas crianças escapam a esta triste sina quando os pais são mais esclarecidos, como o Bill Gates, que afirmou: 'os meus filhos terão computadores, mas antes terão livros' e limitava o tempo deles diante da TV a 45 minutos diários. Outras crianças escapam porque as muitas atividades em que estão envolvidas (culturais, esportivas, etc.) não lhes deixa muito tempo para ver TV.

Locke dizia que 'não há nada no domínio da razão que não tenha passado antes pelos sentidos'. De minha parte, tenho dito que física e matemática não se começa a aprender na escola, mas sim nasprimeiras brincadeiras infantis. A minha má vontade com a TV não se refere apenas ao seu uso por parte de crianças. Acho lamentável que muitas pessoas idosas levem uma vida tão vazia e tão destituída de sentido que não conseguem se desgrudar da TV, desperdiçando seus últimos anos de vida diante dela. E o que épior, acelerando o processo de sua própria decadência, como pesquisas recentes revelam. É como se essas pessoas estivessem renunciando a uma vida útil e ativa e ficassem aguardando o inevitável fim, como condenados no corredor da morte.

Pode ser que nem tudo esteja perdido. A luta pelo desenvolvimento exige competência e não se pode exigir tal coisa de uma geração de iletrados. Desse modo os governos, por mais incompetentes que sejam, vão perceber que alguma coisa precisa ser feita, que providências precisam ser tomadas para elevar o nível cultural do povo, incluindo-se ai as competências lógico-matemáticas. Antes de tudo há que se conscientizar os pais. O problema que eles também são viciados em TV, de modo que a luta será árdua. Eu não chego a ser como o professor Valdemar Setzer, que evitou terTV em casa durante muitos anos, nem tenho filho pequeno que justifique a retirada do aparelho, como fez um amigo meu, para evitar que o filho, de quatro anos, seja prejudicado ela TV. Tenho um único aparelho que uso para ver DVDs e, eventualmente, ver um ou outro programa de TV a cabo. As vezes vale a pena, mas nunca fico muito tempo, pois acho que existem coisas mais agradáveis de se fazer do que ficar parado vendo TV. Gosto muito mais de escrever, por exemplo, como estou fazendo agora.

Há poucos dias vi, no GNT, um programa que trata de uma experiência levada a cabo por uma escola inglesa, e que consistiu na retirada de aparelhos de TV, computadores e videogames, por duas semanas, dos lares cujos pais concordaram em participar da experiência. A escola esperava que o teste tivesse algum impacto no desempenho escolar dos alunos, o que de fato houve, mas o impacto maior foi na própria vida do lar e na relação entre as crianças e entre elas e seus pais.

A primeira e importante conclusão foi: TV NÃO FAZ FALTA. As crianças começaram a usar a imaginação nas suas brincadeiras e a jogar xadrez e outros jogos e a brincar mais. Uma coisa que ficou manifesta é que os pais, quando diziam que não sabiam como as crianças iriam se sentir, na verdade estavam preocupados com o que eles, pais, iriam sentir. Tratava-se, pois, demera projeção. Ficou claro que muitos pais usam a TV para controlar os filhos (babá eletrônica) e sem ela eles precisariam mostrar que estavam a altura do desafio de serem pais.

A retirada da TV e de outros aparelhos proporcionou uma maior interação entre os membros da família. As crianças se acalmaram porque passaram a receber mais atenção e o ambiente melhorou consideravelmente.

Ao término da experiência em alguns casos o consumo da TV reduziu-se em 50 por cento. Alguns pais resolveram tirar a TV dos quartos dos filhos, bem como dos seus próprios quartos, conservando uma única TV na sala para que todos pudessem vê-la conjuntamente.

Em suma, quando nos Estados Unidos alguns grupos começaram a fazer campanha cujo slogan era DESLIGUE A TV. LIGUE-SE NA VIDA, eles sabiam o que estavam dizendo. O Brasil é um país onde as pessoas ficam muito tempo diante da TV. Não por coincidência os nossos estudantes se saem muito mal em matemática, ciências e idiomas quando comparados a estudantes de outros países. Salta, pois, aos olhos que temos sido bastante estúpidos em relação a esta questão, mas não há nenhuma razão para que continuemos a sê-lo, indefinidamente.

Rio de Janeiro, 29 de março de 2008

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