Nosso Cérebro Quatriurno

  

A ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO NOSSO CÉREBRO TRIURNO

“Nós temos três diferentes estruturas neurais, onde antes pensávamos que fosse apenas um cérebro singular”

Joseph Chilton Pearce

          A princípio, os neurocientistas classificaram, funcionalmente, o nosso cérebro em anterior e posterior. Aquele envolve o sistema nervoso intracraniano e esse último engloba o nosso sistema neural primário, no coração, e o sistema sensório-motor da medula espinhal com suas conexões nervosas por todo o nosso corpo.

          Por mais de 50 anos, o neurocientista Paul Maclean e sua equipe estudaram e publicaram trabalhos acerca da similaridade existente entre os nossos sistemas neurais e as estruturas cerebrais dos três maiores grupos de animais em evolução (répteis, mamíferos primitivos e mamíferos superiores) e de como o nosso sistema neural carrega em si mesmo potenciais de inteligência e habilidades desenvolvidas em cada uma dessas épocas de sua própria evolução.

          Cada um desses sistemas é uma evolução do anterior, demonstrando maior eficácia e campo de ação para expandir as suas próprias possibilidades, sem ter que abandonar o sistema antigo. Projetados para trabalhar de forma integrada, nos dando uma “habilidade de ascensão e capacidade de irmos além de todas as restrições e limites”, quando desintegrados são o motivo de nossas guerras internas, quando nos tornamos inimigos de nós mesmos!

 

Sistema Reptiliano instintos de sobrevivência física: alimento, abrigo, sexo, território e estados corporais (saúde e doença) respostas simples baseadas em atração-repulsão Inicia suas funções no 1º trimestre de gestação e está totalmente desenvolvido após o primeiro ano de vida
Sistema Límbico comportamentos mais flexíveis que o do puro instinto de sobrevivência respostas mais complexas em tons diversos de sentimentos de bom e mau, alegre e triste, gostos e desgostos, dor e prazer, amor e ódio. Inicia suas funções no 2º trimestre de gestação e seu desenvolvimento após o 1º ano de vida. Está totalmente desenvolvido aos sete anos de idade.
Neocórtex comportamento baseado em cálculos e pensamento intelectual com duas polaridades: hemisfério esquerdo (do cérebro) Inicia suas funções no 3º trimestre de gestação e seu desenvolvimento após o sétimo ano de vida. Está totalmente desenvolvido aos 15 anos de idade

         O desenvolvimento desses três cérebros na vida intra-uterina se dá de uma forma seqüencial e hierárquica, da mesma forma que ocorre na história da evolução: o reptiliano inicia suas funções no primeiro trimestre da gestação, o límbico no segundo e o neocórtex no terceiro trimestre. Cada nova estrutura neural é construída sobre a base da estrutura que se formou antes dela, incorporando às suas funções a função dessa primeira, modificando a sua natureza original para que venha a ser compatível com o novo sistema. Assim, o sistema reptiliano comanda o sensório-motor e sistemas de sobrevivência, mas também está subordinado ao, até mais inteligente e complexo, sistema do mamífero. Isso é a transcendência em ação! Há uma independência e uma interdependência entre esses três sistemas, que é fundamental para que não ocorram problemas.

          O problema mais comum, quando essa integração falha, é a disputa pelo poder e a dificuldade de comunicação entre eles: id reptiliano, ego mamífero e superego neocortical. Essa é a fonte de toda a desordem.

O CÉREBRO REPTILIANO

          Evoluiu de forma a obter estratégias de sobrevivência e subsistência, controlando inúmeras decisões no que diz respeito ao próprio bem-estar físico, inclusive, se necessário, procedendo de uma forma dissimulada, ‘mudando de cor’ de acordo com o meio social, como forma de autoproteção. Não poderíamos ter evoluído ou sobrevivido se esse nosso ancestral reptiliano não houvesse instalado a sua oficina em nossa base neural.Produz uma vida totalmente autocentrada, onde a percepção de um mundo pessoal interno prepondera e nos faz continuamente a permanecermos ‘rodando em torno de nós mesmos’, atrás de nosso próprio rabo. Essa ‘introspecção’ provoca a grande inércia típica dos répteis, que agem (se movem) somente em busca de sua autopreservação: se nada os ameaça eles não se movem.

          A percepção sensorial preponderante do sistema reptiliano é a percepção tátil e o único discernimento visual que ele pode ter é o contraste do claro e escuro. Assim, seu relacionamento com aquilo que é externo é muito simples: “é algo para comer, é algo que vai me comer ou é algo para eu me acasalar?” Baseado nisso, nossas reações de resposta são apenas duas: dissimular e atacar, ou dissimular e fugir! Desimpedido de emoções, ou de qualquer outra consideração, esse sistema pode tomar rápidas decisões rápidas, por reflexo, em casos de emergência, condição conveniente em situações de combate, fazendo com que suas reações muitas vezes sejam extremamente violentas e agressivas.

          Esse sistema é a fonte de todos os nossos hábitos e rituais. Incapaz de fazer alterações em seu comportamento, tanto no que foi herdado quanto no que foi adquirido, este cérebro antigo se encarrega também da aprendizagem de nossas habilidades motoras repetitivas: andar de bicicleta, dirigir um carro, digitar no teclado ou dedilhar teclas de um piano.

Palavras-chave: dissimulação, ataque e fuga, autopreservação e autocentrismo, alimento e abrigo, território e instintos, inércia e tempo presente.

O CÉREBRO COGNITIVO-EMOCIONAL

          Esse cérebro passou a estar presente no mamífero primitivo, e é conhecido como sistema límbico, por envolver o sistema reptiliano como um limbo. Aqui, a natureza adiciona a percepção olfativa e auditiva ao limitado sentido de percepção do réptil, elevando o nosso sistema sensorial a um novo patamar de percepção do mundo.Pela primeira vez surge uma possibilidade nova de relacionamento com o externo, com o outro, através de novas ferramentas de avaliação qualitativa usando aquilo que chamamos de capacidade cognitivo-emocional. Surge a consciência hereditária de não nos alimentarmos de nossos filhotes, mas sim de alimentá-los. Surge a capacidade de relacionamento com o mundo externo e não somente de ação reativa baseada no senso de autopreservação (reação às sensações).

          Esse cérebro é o centro de todos os nossos relacionamento e está diretamente envolvido com o processo de trazer de volta o que já conhecemos: nossa memória. Existem duas estruturas situadas anatomicamente entre o cérebro sensório-motor reptiliano e o sistema límbico, a amígdala e o hipocampo, responsáveis, respectivamente, pelas nossas primeiras experiências emocionais e de sobrevivência e aprendizado (três primeiros anos de vida) e pela memória geral, momento a momento (após os três anos de vida).

Palavras-chave: comportamentos, emoções, inteligência mais adaptável ao meio ambiente.

O CÉREBRO VERBAL-INTELECTUAL

          Esse cérebro introduz a habilidade de poder observar objetivamente as atividades puramente reativas e cognitivo-emocionais dos outros dois cérebros, e na capacidade de considerar todos os fatos através do pensamento. É o pensamento que introduz a percepção de passado e de futuro.

          E se? Síndrome do futuro…  com suas ansiedades e inquietações. Não parece haver limites em relação ao que esse cérebro é capaz de interpretar, desde a absorção de coisas relativas ao mundo exterior até a imaginação criativa e os pensamentos internos. Conhecido como neocórtex, fez surgir no mamífero superior a capacidade da curiosidade e do criar, o impulso por novidades e o desejo de conhecer. É através desse cérebro que nos sentimos motivados a expandir constantemente os nossos conhecimentos e experiências. Um movimento em direção ao novo, que é a ferramenta da evolução e da transcendência. É a partir da ação do neocórtex, que a capacidade reptiliana de dissimulação se transforma em capacidade de elaborar estratégias no intuito de ser bem sucedido no mundo.

          É por essa associação que nos alegramos quando obtemos o queremos por maneiras fraudulentas, ou nos lamentamos em frente ao desapontamento dessa conquista. É essa associação, também, o responsável pela racionalização habilidosa de nossas atitudes supostamente imorais, fazendo com que sejam moralmente aceitas, pelo menos para nós mesmos. Mas essa associação também eleva a eficácia e a rapidez das decisões em momentos de emergência, mobilizando todo o intelecto a favor da rede de defesas do sistema reptiliano, principalmente em situações onde essa abordagem mais integrada se faz necessária. Somente assim podemos nos afastar da situação, acalmarmo-nos, monitorar ou mesmo redirecionar a nossa resposta com mais sensatez e sem a violência típica do sistema reptiliano.

          A capacidade abstrata para o pensamento associativo, quer seja científico, matemático ou filosófico, tem sua base no lado cognitivo-emocional do mamífero primitivo. É através da união desses dois cérebros mais evoluídos que podemos alterar as funções básicas do sistema reptiliano, incapaz de mudar sua rotina de repetição automática. Foi através desse processo que conseguimos criar novas maneiras de nos mantermos aquecidos no inverno, ou andar sem prejuízo através de pontos em fogo!

          O desenvolvimento do neocórtex influenciou diretamente na função dos outros dois sistemas, de forma que nosso sensório-motor (reptiliano) e nosso emocional-cognitivo (límbico) funcionam em nós de uma forma diferente da forma como funciona nos animais. A presença do neocórtex transforma as suas naturezas (somente nos casos em que essa estrutura mais evoluída esteja desenvolvida). Somente assim é que podemos equilibrar as reações instintivas menos evoluídas de nosso sistema de sobrevivência e cognitivo-emocional.

          Os dois lados do neocórtex (os dois hemisférios cerebrais) lidam com formas diferentes de perceber e imaginar o mundo: enquanto o hemisfério esquerdo foca os pequenos elementos de uma visão de mundo, o hemisfério direito os reúne.

Hemisfério Esquerdo Hemisfério Direito
A visão especifica A visão geral
Foca as partes para saber como agir baseado nelas, produzi-las e reproduzi-las como uma fórmula Procura saber como as partes se encaixam no contexto de nossa vida
Forma a base para a lógica formal e para a inferência Forma a base para a percepção espacial e temporal.

 

“É claro que não temos dois cérebros, mas sim um único cérebro, com diversas especializações e duas formas principais de organizar o mundo. Não se trata de um impasse, onde temos de optar entre uma coisa ou outra, ou a esquerda ou a direita. O objetivo final da compreensão do cérebro, pelo menos nessa divisão, não é uma questão de estimular o lado direito do cérebro, mas sim todo o cérebro”.

Roberto Ornstein (in ‘A Mente Certa’, Editora Campus, 1988)

          Podemos parafrasear Ornstein afirmando que não se trata de separar o cérebro em dois, três ou quatro cérebros, pois todas elas não funcionam isoladamente uma da outra. Cada impulso nervoso eletroquímico dos sistemas reptiliano, límbico e do neocórtex direito e esquerdo, sempre ativam diversas estruturas em cada um “dos cérebros”, entre elas o hipotálamo (o ‘cérebro do cérebro’), local onde também aporta o sistema endócrino, com a epífise (glândula pineal) e a hipófise (glândula pituitária), que com seus hormônios atingem todas as outras glândulas do organismo.

Palavras-chave: intelecto, capacidade de cálculo, pensamento criativo, empatia e compreensão.

Morri como um mineral e me tornei planta.

Morri como planta e me ergui como animal.

Morri como animal e era humano.

Porque devo ter medo?

Quando fui menos por morrer?

Ainda mais uma vez morrerei como humano.

Para voar mais alto, entre os anjos.

E quando sacrificar minha alma de anjo

Devo me tornar o que não cabe na imaginação.

OS LOBOS PRÉ-FRONTAIS

          À frente de nosso neo-córtex localizam-se os nossos lobos pré-frontais. Enquanto, filogeneticamente, o nosso cérebro reptiliano tem centenas de milhões de anos, fatos indicam que o pré-frontal aingiu há 400 mil anos de o tamanho e o valor atuais. Essa área, que já foi chamada de área silenciosa do cérebro, devido ao desconhecimento total de sua função, hoje é conhecida como a sede de nossas “grandes virtudes humanas”, como o amor incondicional, a compaixão, empatia e compreensão.

          Essa área se desenvolve dos quinze aos 21 anos de idade e responde endocrinamente ao coração, através da secreção de FNA (fator naturético atrial) por esse último. O idealismo passional que surge no início da puberdade, seguido da expectativa passional de que “algo extraordinário está para acontecer”, que se sucede no meio da adolescência, e pela falta limites que ocorre como a percepção de “uma grandeza escondida dentro de si próprio”, é uma conseqüência dessa ligação química.

          O adolescente sempre gesticula em direção ao próprio coração, principalmente quando está expressando grandes expectativas, mostrando que o coração está envolvido nesses sentimentos e pensamentos. Ou seja, o cérebro é o modus operandi do coração.Antônio Damásio, conhecido neurocientista português e diretor do departamento de neurologia da Universidade de Iowa (Estados Unidos) e professor no Instituto Salk para estudos biológicos (Jolla, Califórnia), considera que as nossa habilidades de calcular e raciocinar, analisar e pensar criativamente são habilidade intelectuais avançadas ao cargo dos lobos pré-frontais. É o responsável por nos dar a nossa mente civilizada.

          Eles desempenham um papel crucial no desenvolvimento da linguagem, interagindo com os lobos temporais: a linguagem concreta (pré-frontal e temporal direito) e a linguagem semântica (pré-frontal e temporal esquerdo). Mas seu papel regular, sobre os outros três cérebro, se faz pela excitação ou inibição pela “regulagem do afeto”: uma habilidade vitalícia de regular nossas reações emocionais, controlar nossos impulsos ou moderar os reflexos de sobrevivência do reptiliano, governando todas as ações desse módulos mais primitivos de nosso cérebro.

          A conexão neuronal entre essa parte mais nova e a antiga se faz por uma região conhecida como giro órbito-frontal (porque ele está centrado atrás da órbita do olho), que é o responsável em determinar os relacionamentos e as habilidades mentais de uma pessoa.Palavras-chave: inteligência, transcendência, humanidade, amor, coração.

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