Alma e Espírito

“Porque me viste, Tomé, creste; bem-aventurados os que não viram e creram”.

Jesus, o Cristo (Jo 20:29)

 

“O que toda religião chama de 'alma' é o sentimento de si mesmo (self), um tipo de autopercepção”. 

Wilhelm Reich (1.897-1.957)

 

 

“Conhece a ti mesmo e conhecerás o Universo e os deuses”.

Inscrição na porta do oráculo de Delfos

 

Todas as escrituras afirmam que há algo além do corpo físico do homem. Para os hindus, a verdadeira ignorância (avidya) é não saber que temos uma natureza divina e que a única realidade é a realidade espiritual. Só podemos conceber a existência dessa realidade espiritual, sem a matéria, através de nosso pensamento. Para que os nossos sentidos possam perceber esse princípio superior, que nos anima, é necessária a união do espiritual e do material, dentro de nós mesmos.

Krishna, da mesma forma que Cristo (Jo 2:20ss), afirmava a existência de um corpo, templo do espírito, que servia de habitação à alma (Bhagavad Gita 2:18 e I Cor 3:16). Para Santa Tereza d’Ávila (1.515-1.582), dentro do corpo existiria um “castelo de diamante”, nossa alma, composto de muitas moradas (aposentos) 92:19. Os conceitos de alma e espírito seriam os que mais se aproximam do acima mencionado “Eu superior” do homem, mas esses termos causam muita confusão nas pessoas. Muitos de nós os tomamos como sinônimos. Será que o são? Se não o são, o que podemos tomar como o nosso “Eu superior” e qual o significado que restaria para o outro termo?

Para o psicólogo Alfred Adler (1.870-1.937), a alma seria um órgão psíquico, “um complexo de poderes em movimento que são, entretanto, o resultado de uma causa unitária e que lutam pela consumação de uma meta única” 24:141. Já para Carl Gustav Jung (1.875-1.961), “almas correspondem ao complexo autônomo do inconsciente pessoal e Espírito aos do inconsciente coletivo” 24:141. Nas tradições religiosas, espírito é aquilo presente nas profundezas de nosso ser que nos faz seres divinos, mas normalmente, emprega-se a palavra espírito em dois sentidos, que no fundo são a mesma coisa: como algo que existe no âmago do ser humano que o torna cósmico e universal, e como algo que o torna distintamente humano (processo de individuação).

Indo às Escrituras cristãs vemos que elas citam os termos alma e espírito como tendo uma significação diferente. Segundo São Paulo (I Cor 15:44-45), o homem é composto de um corpo natural, uma alma vivente, como no primeiro Adão bíblico (Gn 2:7), e um espírito vivificante, como no segundo Adão bíblico (Cf. mais detalhes sobre os diversos “Adão” em “A NOSSA TERRA”). O termo “alma vivente”, do original “nephesh”, no antigo testamento da Bíblia Sagrada é às vezes traduzido como “alma”, “vida”, “ser vivo”, “ser vivente” ou “animal vivo”. Esse termo se repete como animando também a todos os animais (Gn 1:20s, 1:24, 1:30, 2:7, 2:19, 9:5, 9:10-16).

Em I Ts 5:23 São Paulo cita: “…que todo o vosso ser, espírito, alma e corpo, seja conservado irrepreensível para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo”, e em Hb 4:12: “…a palavra de Deus… atinge até a divisão da alma e do espírito”. Jesus dizia: “Amarás o Senhor teu Deus de todo teu coração, de toda a tua alma e de todo teu espírito” (Mt 22:37). Já no livro “Imitação de Cristo” (III, 13:1), considerado por alguns teólogos como um quinto Evangelho, vemos: “pior inimigo e mais perigoso não tem a alma, que tu mesmo, quando não obedeces ao espírito”.

Dessa forma vemos que o cristianismo vê o ser humano como um ser ternário: corpo, alma e espírito. Paracelso (1.493-1.541) ensinava a existência de três espíritos no homem: o dos elementos (corpo terrestre e força vital), o dos astros (corpo sideral ou astral – alma) e o espírito divino (Augoeides). Segundo Plutarco (46-119 d.C.), Platão (428-348 a.C.) explicava que o homem é composto de um corpo mortal (Soma), um instinto animal irracional (Anoia), uma alma mortal separada, ou Psique (????), e um princípio “imortal”, ou Nous (????) – Cf. em “Platão“. Nous excede à psique e esta é mais divina que o corpo. A composição de Nous com a Psique constituiria a razão e de Anoia com a Psique a paixão. Essa composição seria o princípio do prazer e da dor e aquela composição o da virtude e do vício.

Mas Pitágoras (580-500 a.C.) havia detalhado mais ainda. Ele dizia que além do corpo humano (Soma) há uma parte invisível que pode ser dividida em duas partes: uma parte animal, irracional mortal, Agnoia ou Anoia, e outra racional (Agathon), composta de três elementos: Nous ou alma, Phren ou mente e Thumos ou sopro de vida, alento, mas mesmo esses dois últimos elementos seriam mortais. Um último componente, descrito nos Mistérios gregos como Eidolon, consistia numa “forma sombra” ou duplo humano, a que os hindus chamam de Linga-Sharira. Elevou, assim, a constituição humana, de três, para seis princípios: o corpo, o duplo humano (Eidolon), o sopro de vida (Thumos), um princípio irracional mortal (Anoia), a mente (Phren) e a alma (Nous).

Para Jean-Yves Leloup, haveria três dimensões principais no ser humano (Soma, Psique e Nous) que seriam interpenetradas por uma quarta dimensão, essa sim imutável, chamada Pneuma, em grego, Ruah, em hebraico, ou Espírito, em latim 25:33. Essa seria a nossa Essência, fonte de nossa saúde e dimensão da Eternidade: “aquilo que resta quando já não resta mais nada…”.

Mas os egípcios já consideravam, há milênios, o homem um ser setenário, composto de um corpo material (Chat), a força vital (Anch), o duplo etérico (Ka), uma alma animal (Ab Hati – sentimento), uma alma racional (Bah – inteligência ou percepção), uma alma espiritual (Cheibi) e um Espírito Divino (Ku), sendo que o homem só tinha consciência até a sua alma racional (Bah). Para eles, o corpo material (Chat) seria o templo da alma (Bah) e morada do espírito divino (Ku), sendo o coração humano o seu altar (Cf. Volume 1). Platão e George Ivanovich Gurdjieff (1.870-1.949) usaram uma metáfora, presente no Katha Upanishad 71:40, para descrever o ser humano, comparando-o a uma atrelagem com um amo (Atma – aquele que dá a ordem), um cocheiro (Buddhi – a inteligência), as rédeas (Manas – a mente lógica), um cavalo (Indryas – os sentidos) e uma carruagem (Sharida – o corpo físico).

São João da Cruz (1.540-1.591), sacerdote da ordem dos Carmelitas, reconhecido como doutor da Igreja Católica em 1.926, concebia o homem como constituído de uma parte externa, uma interna e o “centro da alma” 87:11. À externa ele chamava de “sentidos”, que incluía os cinco sentidos do corpo físico, as paixões, a vida emocional (alegria, esperança, tristeza e medo), as nossas tendências e apetites (todos os prazeres), a imaginação e até a inteligência. À interna ele chamava de “espiritual”, onde residiria a vontade, o amor e a paz, e a inteligência que é independente dos “sentidos”: a sabedoria espiritual, a inteligência mais profunda e intuitiva. E no “centro da alma” estaria a nossa parte santa e genuína, onde somos “a imagem de Deus”. Nesse ponto somos um templo vivo de Deus.

 

“O centro da alma é Deus” 87:12.

São João da Cruz

 

“Não te esqueças de que és templo de Deus, o Paracleto está no centro de tua alma. Escuta-o e segue docilmente suas aspirações” 16:31.

São Josemaria Escrivá (1.902-1.975)

 

Somos extensões da Consciência Primordial, aspectos de sua energia divina num processo constante de aquisição energético-informativa, que a retro-alimenta. A sabedoria arcana nos detalha quem é o Ser humano e que ele é composto por quatro princípios básicos e três princípios superiores…

 

Cf. também:  Princípios Básicos

                        Princípios Superiores

 

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