Armar-se de Quê?

Após um ano do início da campanha do desarmamento, estatísticas por todo o país mostram que a violência não diminuiu, mas aumentaram os crimes com o uso de armas, durante o ano de 2.004. Será que houve alguma falha??! Será que teremos que montar esquemas e empresas de treinamento de tiro, movendo toda uma corrida por privilégios governamentais para tal, empresas de treinamento psicológico para toda a população brasileira, para que essa saiba quando usar e quando não usar sua pistola Magnum 357, ou seu fuzil AR-15, adquiridos legalmente para sua autodefesa. Milhões gastos em munição para treinamento pessoal, subsidiados pelo governo, para proteger o cidadão de bem?! Ademais, temos realmente o direito de tirar a vida de qualquer ser vivo como, no caso em questão, a de um ser humano? Jesus o fez com quem estava o matando? E como lidar, então, com o mal que nos envolve a todos e que habita dentro de cada um de nós, nossos desejos íntimos de vingança, nossas raivas, nossas negatividades que escondemos de nós mesmos por nos julgarmos bons demais para tê-las.

 

Por graça divina, habitamos uma dimensão onde a Dualidade habita como Lei. Qualquer corrente filosófica, psicológica, religiosa e até matemática concorda com isso: o positivo e o negativo, o masculino e o feminino, o consciente e o inconsciente, a Luz e a Sombra, o bem e o mal, o Yin e o Yang… E o Princípio do Equilíbrio é a nossa maior meta: aceitar, harmonizar e unir as dualidades dentro de si de forma a atingir o Zero, o Vazio, o Nada, que na realidade é Tudo. Muita filosofia não é. E o que faço com aquele assaltante que está em vias de atirar em mim ou que matou o meu filho para assaltá-lo?

Mas vamos filosofar mais um pouco. Por aquela Tese do Princípio do Equilíbrio, toda vez que a Luz aumentar em nossa dimensão a Sombra terá que aumentar também para equilibrar, e toda vez que a Sombra ressurge com toda a sua força, Seres de Luz sempre se encarnam para “restaurar o Dharma” (restaurar a Lei), como dito no Bhagavad Gita, livro sagrado hindu. Nesse livro, um guerreiro chamado Árjuna questiona-se com o seu Mestre Krishna sobre seu dever de combater e matar seus irmãos e parentes que estão a postos nas fileiras inimigas.

E Krishna começa ensinando que quem morrerá será somente o corpo físico de seus irmãos, e que eles não são o corpo físico, mas são almas imortais vestindo corpos materiais para viver experiências materiais, e que ele, como guerreiro, tinha o dever de combater sem peso na consciência de estar deixando livres as almas deles de seus corpos. Ou seja, quem tem a missão de usar armas, se necessário for, deverá utilizá-las sem temor. A questão é: será que a humanidade inteira tem essa missão ou somente militares, policiais e profissões afins o têm?

O que em mim atrai por vibração o mal externo? O que tenho dentro de mim que faz com que as coisas que não desejo aconteçam? E se acontecerem serão culpa do outro? O que o mal tem para me ensinar, pois ele deve ter uma função, senão Aquele que não tem nomes não teria permitido a sua existência. Na realidade, todo mal acontece conosco quando encontra ressonância em nosso íntimo, quando trás em si ensinamentos ou quando representa efeitos de causas geradas por nós mesmos (Lei do Karma). Então não devemos fazer nada acerca do sofrimento do outro, pois não nos diz respeito, somente pelo fato de que “ele merece o que está ocorrendo com ele”? Não, a compaixão é uma virtude que nasce quando vemos o outro como sendo nós mesmos e passamos a desejar ao outro aquilo que desejamos para nós mesmos.

E o que desejamos para nós mesmos? Uma vida livre de sofrimentos ou uma vida sábia em que o discernimento nos diz os porquês e os para quês de nossos sofrimentos? Ademais, qualquer “criminoso” é apenas um doente mental e emocional, vítima de um sistema excludente. Seres de luz vivendo suas negatividades. A psicologia nos afirma que todos temos uma sombra onde escondemos tudo aquilo que não queremos ver, em geral nossas negatividades. E qual é a sombra de um “criminoso”? É a sua luz…

Todos são potencialmente recuperáveis. O que macula qualquer assassino é que ele mata por interesse, por raiva, ódio e vingança, e não por dever de um guerreiro durante a sua batalha. Não combater o mal com o mal é uma norma de conduta ética presente em todas as tradições e pôr armas nas mãos de pessoas que com certeza vão usá-las para retaliar agressões sofridas é estimular a manifestação da sombra de cada um. Gandhi libertou seu país sem pegar em armas. A maior arma é a manifestação da própria luz e é isso que o poder público deve incentivar em seu povo, do cidadão de bem ao criminoso.

Aqui em Fortaleza, em trabalhos voluntários que conheço, quando se levou a arte, o autoconhecimento, exercícios de relaxamento e meditação a presídios, até o mais duro preso chorou as suas dores, depoimento que ouvi de diversas pessoas descrentes que a isso presenciaram: “eles também são gente!!” O projeto de desarmamento, segundo ouvi das palavras do próprio Ministro da Justiça, visa à educação para a paz, à educação da não-violência física (a que menos danos traz) e da não-violência psicológica, fonte de todas as violências e a violência que mais danos traz à alma, a violência que mais feridas causa e a de mais difícil cura.

Somente os guerreiros deveriam ter a honra de portar uma arma física, da mesma forma que o sábio usa o seu poder de discernimento, o comerciante usa as suas armas, pois cada qual tem as suas guerras específicas e as suas armas específicas que tem permissão psicológica, ética, moral e dhármica de usar. Só o amor nos salvará, mesmo que matem o nosso corpo físico. Amor, compaixão, perdão e educação integral (física, emocional, intelectual e espiritual) são a solução.

 

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