Sobre as Trevas e a Luz

Esta é uma carta de H.P.B., escrita em Dehra Dun. Ela tinha deixado Simla e estava viajando pela região norte da Índia. A carta inclui, sob ditado de M., uma mensagem em resposta a outra carta de Sinnett. Também Sinnett havia saído de Simla em direção a sua casa em Allahabad.

Carta nº 30 (ML-134), recebida em torno de 4 de novembro de 1881

Extraído do Original em  “Cartas dos Mahatmas para A. P. Sinnett” Editora Teosófica, Volume II, julho 2001

 

Cheguei somente ontem, tarde da noite, de Saharanpur. A casa é muito boa, mas úmida, fria e triste. Recebi uma montanha de cartas e respondo primeiro à sua.

Por fim vi M. e lhe mostrei a sua última carta, ou melhor, a de Benemadhab, na qual você escreveu uma pergunta. É a essa que Morya responde. Escrevi o seguinte sob seu ditado e agora copio.

Escrevi 1 a Sinnett a minha opinião sobre os teósofos de Allahabad (embora não através de mim?). Adityaram B. escreveu uma carta tola a Damodar e Benemadhab escreve um pedido tolo ao sr. Sinnett. Porque K.H. decidiu corresponder-se com dois homens que demonstraram ser da maior importância e utilidade para a Sociedade, eles todos – sábios ou estúpidos, inteligentes ou obtusos, possivelmente úteis ou completamente inúteis – fazem os seus pedidos no sentido de manter correspondência diretamente conosco, também. Diga a ele (a você) que isso deve terminar. Durante eras não temos mantido correspondência com ninguém, e nem temos a intenção de fazê-lo. Que fez Benemadhab ou qualquer outro dos muitos solicitantes para ter direito a esse pedido? Absolutamente nada. Eles ingressam na Sociedade e permanecem tão apegados como sempre às suas velhas crenças e superstições, nunca abandonam sua casta nem um só de seus costumes, e em seu exclusivismo egoísta esperam nos ver, conversar conosco e obter a nossa ajuda em tudo e em qualquer coisa. Gostaria que o sr. Sinnett dissesse o seguinte a todos que se dirijam a ele com pretensões semelhantes: “Os ‘Irmãos’ desejam que eu informe a cada um de vocês, indianos, que, a menos que um homem esteja disposto a ser um teosofista completo, isto é, a proceder como D. Mavalankar – abandonar por completo sua casta, as suas velhas superstições e demonstrar ser um verdadeiro reformador (especialmente no caso do casamento de crianças), permanecerá simplesmente como um membro da Sociedade sem esperança alguma de ter relação com eles”. A Sociedade, procedendo nisto completamente de acordo com as nossas determinações, não obriga ninguém a ser um teosofista da Segunda Seção 2. Isso é deixado a cada um e à sua escolha. É inútil para um membro argumentar: “Sou alguém que leva uma vida pura, não tomo álcool e me abstenho de comer carne, e não tenho vícios. Todas as minhas aspirações são para o bem, etc.”, levantando ao mesmo tempo, com seus atos e conduta, uma barreira intransponível entre ele mesmo e nós. O que temos nós, discípulos dos verdadeiros Arhats, do Budismo esotérico e de Sang gyas, a ver com os Shas-tras 3 e o Brahmanismo ortodoxo? Há 100 milhares de faquires, sannyasis e sadhus levando vidas totalmente puras e, entretanto, porque estão no caminho do erro, nunca tiveram uma oportunidade de nos encontrar, de nos ver ou sequer ouvir falar de nós. Os antepassados deles expulsaram da Índia os seguidores da única filosofia verdadeira existente sobre a terra, e agora não são estes que irão até eles, mas eles é que devem vir até nós se o quiserem. Quem entre eles está disposto a se tornar um budista, um Nastika 4, como eles nos chamam? Ninguém. Aqueles que acreditaram em nós e nos seguiram obtiveram a sua recompensa. Os senhores Sinnett e Hume são exceções. As suas crenças não são barreiras para nós, pois não têm nenhuma. Eles podem ter tido influências ao seu redor, más emanações magnéticas resultantes da bebida, da sociedade mundana e de associações físicas promíscuas (resultantes até mesmo de apertar a mão de homens impuros); mas todos esses impedimentos são físicos e materiais, aos quais podemos nos opor com um pequeno esforço, e mesmo eliminá-los sem muito esforço para nós. Mas é diferente com o magnetismo e os resultados invisíveis produzidos por crenças errôneas e sinceras. A fé em Deuses ou em Deus e outras superstições atraem milhões de influências alheias, entidades vivas e poderosos agentes para perto das pessoas, e nos veríamos obrigados a usar algo mais que o exercício comum de poder para afastá-los. Nós decidimos não fazê-lo. Não consideramos necessário nem proveitoso perder o nosso tempo travando uma guerra com planetários 5 atrasados que se deliciam personificando deuses e, às vezes, personagens famosos que viveram na terra. Existem Dhyan-Chohans, e “Chohans das Trevas”, não o que eles chamam de diabos, mas “Inteligências” imperfeitas que nunca nasceram nesta ou em qualquer outra terra ou esfera, tanto quanto os “Dhyan-Chohans”, e que nunca farão parte dos “construtores do Universo”, as Inteligências Planetárias puras que presidem cada Manvantara, enquanto que os Chohans das Trevas presidem os Pralayas. Explique isso ao sr. Sinnett (EU NÃO POSSO) – diga-lhe que leia de novo o que disse a eles nas poucas coisas que expliquei ao sr. Hume, e que ele se lembre de que, assim como tudo neste universo é contraste (não posso traduzi-lo melhor) assim também a luz dos Dhyan Chohans e sua inteligência pura é contrastada pelos “Ma-Mo Chohans” – e sua inteligência destrutiva. Esses são os deuses que hindus, cristãos, maometanos e todos os demais integrantes de religiões e seitas intolerantes fanáticas adoram; e enquanto a sua influência se fizer sentir sobre os seus devotos, não nos ocorreria a idéia de associar-nos a eles nem de opor-nos a seu trabalho, do mesmo modo como em relação aos Gorros Vermelhos 6 na terra, cujos resultados maléficos tratamos de diminuir, mas com cujo trabalho não temos direito de imiscuir-nos, enquanto eles não se interpuserem em nosso caminho 7.

(Você não compreenderá isso, suponho. Mas medite bem sobre isso e o compreenderá. Aqui M. quer dizer que eles não têm o direito, nem o poder, de ir contra a natureza, ou contra aquele trabalho que foi destinado pela lei da natureza para cada tipo de seres ou coisas existentes. Os Irmãos, por exemplo, podem prolongar a vida, mas eles não podem destruir a morte, nem mesmo para eles próprios. Podem até certo grau reduzir o mal e aliviar o sofrimento: mas não podem destruir o mal. Do mesmo modo os Dhyan Chohans não podem impedir o trabalho dos Mamo Chohans, pois a Lei destes é trevas, ignorância, destruição, etc., assim como a Lei dos primeiros é Luz, conhecimento e criação. Os Dhyans Chohans respondem a Buddh, Sabedoria Divina e Vida em conhecimento abençoado, e os Mamos são a corporificação na natureza de Shiva, Jeová e outros monstros inventados, que têm a ignorância como seguidora.)

A última frase de M. que traduzo é a seguinte: “Diga a ele (a você), pois, que para o bem daqueles que desejam aprender e ter informações estou disposto a responder as duas ou três consultas de Benemadhab sobre os Shastras, mas que não estabelecerei correspondência alguma com ele ou qualquer outro. Que ele entregue as suas perguntas, claras e definidas, ao sr. Sinnett (a você) e, então, eu responderei através dele (de você)”.

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Envio a você a carta de meu tio que acabo de receber. Ele diz (como mostra a minha tradução da carta dele em russo) que escreveu o mesmo para você. Não sei se você a recebeu ou não, mas mando-a para você. Se é idênti-ca à sua, envie-me de volta a minha. Suponho que agora esteja bastante comprovado que eu sou eu e não outra pessoa; que sendo meu tio agora Ministro adjunto (ou assistente) do Interior, é um personagem que, ao assinar com o seu nome completo, pode ser certamente confiável, a menos, na verdade, que os C. e M. 8 e o seu amigo Primrose inventem uma nova versão e digam que nós forjamos os documentos. Mas meu tio me diz em sua carta oficial que o Príncipe Dondoukoff me enviará um documento oficial para provar a minha identidade, e assim esperamos. Não posso traduzir a outra carta reservada dele, porque a sua fraseologia é bem pouco lisonjeira para com o senhor Primrose em particular, e os anglo-indianos em geral, que me insultam e vilipendiam. Pedirei ao Príncipe que escreva ao lorde Ripon ou a Gladstone diretamente.

Atenciosamente no amor de Jesus,

H.P. Blavatsky.

Por que cargas d’água o “Chefe” quer que eu vá a Allahabad? Não posso estar gastando dinheiro em ir e voltar, pois tenho que ir através de Jeypur e Baroda, e ele o sabe. O que isso tudo significa está além do que posso compreender. Ele me fez ir até Lahore e agora é até Allahabad!


1 Aqui começa a mensagem do Mestre M. (N. ed.bras.)

2 A Sociedade tinha três seções. Da primeira, faziam parte apenas Adeptos. A segunda era formada por discípulos. Os membros neófitos integravam a terceira seção. (N. ed. bras.)

3 Shastras – escrituras sagradas do hinduísmo. (N. ed. bras.) 165

4 Nastika – ateu, ou alguém que não reconhece deuses e ídolos. (Ed. C.)

5 Isto é, espíritos planetários. (N. ed. bras.)

6 Seita cujo trabalho é contrário à evolução espiritual. (N. ed. bras.) 166

7 Aqui termina a primeira parte da citação das palavras do Mestre. As palavras a seguir, entre parênteses, são de H. Blavatsky. (N. ed. bras.)

8 C. e M. – Provavelmente abreviatura de “Cristãos e Missionários”, que estavam empenhados em atacar o movimento teosófico. (N. ed. bras.)

 

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