A Auto-realização – cont…

2. A ILUMINAÇÃO

Quando conseguirmos nos tornar uma fonte de inspiração para todos os que encontramos, então estaremos vivendo a nossa luz.

 

“Entrarás na Luz, mas não tocarás a Chama” 90:40.

 

Cada êxito, nesse caminho da consciência, é uma iniciação a uma nova etapa do caminho. E a meta final, na nossa evolução humana, é a Auto-realização, transcender o reino da matéria e viver no estado de Iluminação (Nirbija Samadhi) até atingir o mais elevado nível de Samadhi: o Dharma-megha Samadhi (Yoga-sutra IV-29). Um dia, simplesmente você descobre que chegou. Simplesmente acontece, instantaneamente, sem causas, sem preparos e sem solicitações. Mas a mente vazia é indispensável. Não deve haver mais procura por objetivos, nem mesmo pelo Nirvana, nem mesmo pela Verdade. Uma mente que não está esperando por nada, nem mesmo por Deus, ou por Brahma.

A mente apenas é, sem qualquer anseio, sem qualquer desejo, sem qualquer vontade. Ao chegar nesse estado mental, o homem individual (Manas superior ou o corpo causal) se identifica e se une com o Espírito Santo, com Atma, ficando apto a facilitar essa união nos outros. As escrituras hindus (Upanishads) o chamam Sat-chit-ananda, sabedoria, consciência e beatitude, a consciência pura, transpessoal. O Cosmos some e se funde com o Nada, o princípio e o fim de Tudo.

“Creio, perante a evolução imensa, que o homem universal de amanhã vença o homem particular que eu ontem fui!” 32:90

Augusto dos Anjos (1.884-1.913)

É a 5ª Iniciação dos teósofos, onde os obstáculos restantes foram rompidos: desejo de beleza da forma, ou de existência numa forma, ou desejo de vida sem forma, orgulho e agitação ou irritabilidade, a possibilidade de ser perturbado por qualquer coisa. É intensa a felicidade da alma humana, embora ainda possa haver paixões, guerras e sofrimentos em outros níveis. Embora os corpos mortais (a personalidade) ainda possam estar sintonizados com alguma coisa terrena, a alma preserva sua quietude inalterada, refletindo-a em seus veículos mortais.

“vos despojeis do velho homem, que se corrompe pelas concupiscências do engano, e vos renoveis no espírito da vossa mente, e vos revistais do novo homem, que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade”.

Paulo de Tarso (Ef 4:22ss)

 A personalidade, enfim, passa a ser totalmente esquecida de si mesma. Totalmente transformada, ela não se reconhece mais, não pretende ser nada mais a tal ponto que, quando perseguida, chega a sentir uma felicidade íntima e uma paz profunda, não tendo o menor ressentimento e passando, ao contrário, a ter um maior amor a quem a ofende. A personalidade sabe que não é nada e está totalmente subjugada aos planos superiores, embora não se descuide de suas obrigações materiais e das necessidades de seus corpos.

Antigamente sofria com as vicissitudes da existência física, mas agora só pensa em servir. Antes sentia vontade de morrer, agora deseja, mais que nunca, viver para contribuir para a salvação de todas as almas. Desejaria abdicar de todas as suas alegrias internas, se isso fosse necessário para salvar uma só alma que fosse. Não busca a glória dos santos, mas a glória de servir Àquele de quem tantas graças obteve, embora não se ache merecedor, mas antes um grande pecador: tornou-se um Bodhisattva, um ser de iluminação, da doutrina budista.

Surge um estado de ser filosoficamente complexo de existência e inexistência. Estar unido com Alguém que não se vê, que está em toda parte e em parte alguma, é não estar em lugar algum e ao mesmo tempo em todos os lugares. Se não estou em lugar algum, como posso dizer que eu existo? Se estou em todos os lugares, imanente como Deus também o é, como afirmar que eu ainda sou eu?

Unir-se com o Espírito de Deus é unir-se com toda a Criação. Perde-se o temor da morte física e não se deseja mais alegrias espirituais, aliás, desapega-se de todas as coisas. Procura-se viver sozinho ou ocupado no avançar espiritual de alguma outra alma. Traz consigo o próprio Senhor, Deus vive nele e ele tem consciência disso. Pode, à vontade, abandonar o seu veículo (a personalidade) e viver em outras dimensões, tão bem como pode abandoná-lo definitivamente, quando chegar a hora (Mahasamadhi). Tornou-se, enfim, um Adepto, um Imortal, um Perfeito, um Mahatma, e vive no que a Igreja Católica chama de Reino de Deus, onde os Santos estão em comunhão.

“É necessário que este corpo corruptível se revista da incorruptibilidade, e que este corpo mortal se revista da imortalidade… então se cumprirá a palavra da Escritura: A morte foi tragada pela vitória (Is 25,8). Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão (Os 13:14)?”

Paulo de Tarso (I Cor 15:53s)

Sua alma está em paz e quietude quase contínua e continua seu aprendizado dos mistérios divinos ouvindo-os no total silêncio. Quase contínua porque, por poucas vezes, algumas coisas terrenas insistem em querer-lhe perturbar a paz interior, é lógico, sem êxito. “Nem por um mínimo primeiro movimento ela vacila em suas boas disposições” 92:251 – Santa Teresa d’Ávila (1.515-1.582). Sua determinação em evitar a imperfeição não evita, porém, que pequeníssimas faltas ocorram, em raras ocasiões. A vontade de servir em causas nobres, buscando salvar nem que seja uma única alma, ocupa-lhe todo o ser. Todo o vigor que essa união traz se reflete em todos os outros corpos. Mas, cabe aqui ressaltar, a personalidade, agora submissa totalmente ao “Eu superior”, não goza da mesma perfeição dele, mas apenas reflete a sua perfeição.

“A perfeição não é para aqueles que se esforçam para sentir, parecer ou agir como se fossem perfeitos. É para aqueles, e só para aqueles que estão plenamente conscientes de serem pecadores como os demais homens, mas pecadores amados, redimidos e transformados por Deus”  60:23.

Thomas Merton (1.915-1.968)

Esse estado de paz (bem-aventurança) nos foi mostrado por todos os grandes seres que passaram pela Terra, a despeito de grandes provações dolorosas. A bem-aventurança (Ananda) é o nosso desejo único e verdadeiro. A comunhão do homem, enquanto personalidade, com esse “Espírito de Deus” em nós, seria a meta da perfeição ensinada pelo Cristo: “Portanto sejai perfeitos, assim como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5:48); “…para que sejam perfeitos na unidade” (Jo 17:23); ou “Se queres ser perfeito…” (Mt 19:21).

“Não posso dizer como é um homem auto-realizado, nunca vi nenhum. Antes de buscar a perfeição devemos viver o homem comum, sem automutilação”  19:82.

Carl Gustav Jung (1.875-1.961)

Deve ficar claro aqui, que não existe um limite para o desenvolvimento da consciência, e que essa meta da perfeição atingida não é a perfeição máxima, pois essa está apenas no Absoluto, Deus. Antes é uma perfeição relativa que nos transforma em “Super-homens” que continuam, indefinidamente, sua autotransformação, agora em níveis muito mais elevados (Cf. no Volume 3).

“E então eu deixaria a Terra inteira atrás de mim e atravessaria todo o firmamento médio; alcançaria o maravilhoso éter, chegaria às estrelas e veria a sua caprichosa disposição. Porém, nem aí eu me deteria, mas, indo ainda além, tornar-me-ia um estranho a tudo quanto se move e muda, e aprenderia a Natureza estável, a Força imutável que existe por si mesma, guiando e mantendo vivas todas as coisas, pois que tudo depende da vontade inefável da Divina Sabedoria. Assim, a minha mente deve primeiro desligar-se de tudo quanto está sujeito ao fluxo e à mudança, e quedar tranqüilamente em repouso, a fim de igualar-me à Sua altura, que é perfeitamente imutável; então, ela poderá dirigir-se a Ele através deste nome mais do que familiar e exclamar: Pai”. 43:30

São Gregório de Nissa (335-394)

“A alma do homem é imortal, e seu futuro é o futuro de algo cujo crescimento e esplendor não tem limite” 23:67.

Mahatma Hilarion

“A obra superior que realizaste tão diligentemente na quietude, tem agora de ser aplicada quando estás mergulhado no tumulto de tua vida de cada dia. Se encontrares dificuldade em fazer isso, será talvez porque não ganhaste muito com a obra de quietude. Se estás convencido de que meditar na quietude é melhor do que meditar na atividade, estás [caindo na armadilha da] busca da realidade mediante a destruição de suas manifestações, ou afastando-te das causas para ir em busca do Nirvana” 44:89.

Garma Chang – mestre Zen

Através dos séculos o cristianismo se arriscou numa constante perseguição contra a negação da matéria dos estóicos e gnósticos. Mas o Caminho do Meio será sempre o Caminho. Ir às cavernas interiores e voltar ao mundo, estar no mundo e não ser dele.

Tão importante quanto buscar a Realidade e fugir da Ilusão é não perder de vista a Ilusão enquanto se está ligado à Realidade. Conservar os pés no chão enquanto o ser está em Deus. Na prática Zen isso se faz mantendo os olhos abertos e não se fechando a porta dos sentidos: vivendo o presente. No cristianismo se faz através do serviço, “nunca abandonando a humanidade de Cristo, mesmo nos mais sublimes vôos da contemplação”. No budismo Mahayana e Vajrayana, está no ideal do Bodhisattva, que, em via de iluminar-se, volta à humanidade comprometendo-se a salvar todos os seres vivos. Está no equilíbrio entre os opostos do taoísta e no Caminho do Meio de Buda.

Não se pode perder de vista que minha transformação pessoal, por si só, já transforma o universo em que estou inserido, justamente porque sou parte dele. Uma consciência cósmica desperta sacode o universo inteiro: “um ato de puro amor realiza mais do que todas as obras exteriores no mundo inteiro” 44:94 (São João da Cruz).

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