As Bases Filosóficas e Científicas do Yoga

III CAPÍTULO

 

BASES FILOSÓFICAS E CIENTÍFICAS DO YOGA

Quem sou eu, quem somos nós, o que é a realidade, o que é a verdade? O que é a yoga tem a ver com tudo isto?

Quem sou eu, ou seja, quem é o homem da atualidade, pergunta Cláudio Azevedo. O homem da atualidade é aquele indivíduo que vive uma constante luta pela sobrevivência. É aquele ser que sofre as conseqüências de sua fragmentação, dissociação e desvinculação de sua totalidade, ou seja,  entre  pensamento, sentimento e ação.  Pensa de uma forma, sente de outra e age de outra completamente diferente em meio a suas tensões, medos, angústias, sofrimentos. É aquele que é corpo físico (nome, CPF, identidade, pai, mãe etc), que é sentimento, que  é emoção, que é pensamento.

 Para o autor, ele é físico, mental e emocional. É possuidor de sentimento, conhecimento, desejo e ação; tem sabedoria, compaixão e vontade. É um ser energético com luz, força e vontade espiritual. Este homem é um processo em constante mudança: ação e reação, fluxo e refluxo, criação e destruição…  Ele contém o todo em si e é parte de um todo. É, portanto, personalidade, individualidade e divindade.

 Se este homem é um ser divino, onde está a divindade? Qual é a verdade neste mundo dual, cheio de contradições, de pontos de vistas diversificados, de conflitos, de egoísmos, de mortes, de pobreza, de estresse? O que é certo e o que é errado? O que é bom, o que é ruim para todos os seres humanos? Raiva, ódio, ira, mágoa, egoísmo dentre outras – que respostas humanas são estas?

Cláudio Azevedo afirma que não está havendo, por parte do homem, uma resposta adequada ao estresse, ao mundo em que ele vive hoje. Este homem permanece com agentes estressores dentro de si, mesmo que a situação causal desapareça. E isto leva a doenças degenerativas dos órgãos, diminuição da imunologia, problemas de memórias, entre tantos outros sintomas. A quantidade de adrenalina e cortisol, produzidos de forma desarmônica, promove, segundo Cláudio, uma mudança na programação neuro-endócrina. Os hormônios que antes atuavam beneficamente possibilitando a sobrevivência, na atualidade está destruindo o ser humano. E como acréscimo, o efeito em cadeia: perturbações em um indivíduo afeta de forma negativa todo o meio em que ele vive e tudo que existe no universo é afetado uma vez que tudo está interligado. O mundo é composto de energia vital; a mesma energia que possui o homem, os objetos e a natureza. Há uma interligação entre tudo e todos (seres animados e inanimados). O todo contém as partes, as partes contêm o todo. E assim vai se dando a vida…

Se o homem age freneticamente, egoisticamente, como se desligado e independente desse universo, cria o caos interior e exterior a ele. É o que está acontecendo. Um exemplo disso é o homem, de todas as idades, matando seu semelhante em benefício próprio.

 Como reestruturar este universo? Como tornar cada ser, cada célula, a serviço do todo – cada qual com sua missão específica e dessa forma alcançar o conhecimento verdadeiro, a paz universal?

 Indagações sobre questões existenciais surgem. Quem sou, por que existo, por que existe o universo, de onde vim, para onde vou, por que existe sofrimento, o que devo fazer, como estou neste mundo, qual é a minha missão?

Surge então a necessidade de aprender a lidar com todas estas questões, circunstâncias, com tudo isso que está acontecendo. O eu em busca de novos aprendizados para dar conta dessa nova realidade. O eu buscando sua homeostase individual que em cadeia pode afetar a homeostase planetária.

A Yoga surge como um dos caminhos para se alcançar este objetivo. A intencionalidade da vivência em harmonia consigo mesmo e com tudo que existe no planeta.

Este caminho, o da Yoga, busca uma religação com a verdade.

 

Mas que verdade seria essa?

O que é verdade para um, não é para outro. O que é certo para um pode ser errado para outro. Então, conclui-se que a verdade seria …

Uma verdade que possibilite uma vivência harmônica entre tudo que existe no universo. Ações, pensamentos, sentimentos (compreensão, discernimento, inteligência, sabedoria e intuição) voltados para o bem estar e harmonia entre os seres existentes. Uma vida una, com uma ordem implícita no universo existente. Um todo de infinita paz e infinita alegria. Um convívio fraterno.

O autor afirma existir dentro de cada homem um ser observador que poderá ajudar neste caminho de religação com a verdade e vivência harmônica. Um ser que observa dentro e fora, que enxerga o seu próprio comportamento, seus valores, suas crenças. Que percebe diversas realidades. Que pode apontar a relatividades das coisas, dos valores, os condicionamentos, as mentiras, as verdades, os certos, os errados. Apontar principalmente o caminho da ética, dos valores, da ação para o interesse individual, com cuidado com o coletivo, em favor de si, mas principalmente em favor do humano.

E este ser observador, para o autor, deve ser reeducado para alcançar este objetivo. Propõe então, uma educação integral do ser. Uma educação para o seu corpo, suas emoções, sua mente (personalidade), sua alma (individualidade) e seu espírito (Atma-Paramatma). Uma educação que permita reflexões sobre quem somos nós, que realidade é esta, o que deve ser reaprendido, reintegrado, ressignificado.

E este caminho da educação integral é através da prática da yoga. Uma prático pelo observador, não pela prática em si. Aquietar a mente; reeducar posturas, respiração e principalmente a mente. Uma verdadeira disciplina.

 

Reeducar a mente? Como? 

O filme “Quem Somos Nós”, exibido por Cláudio Azevedo neste módulo,  foi uma provocação aos futuros instrutores em Yoga rumo  a esta educação integral desse ser. Refletir sobre quem somos nós de modo a buscar aprender a ser este eu observador de quem ele tanta fala. O filme fala que criamos a nossa própria realidade. Que só conseguimos ver o que acreditamos ser possível. E que a criamos de acordo com os padrões de associação já existentes dentro de cada um de nós. Através de longo aprendizado nos condicionamos a pensar-nos como existentes fora de nós mesmos, a valorizar tudo que é externo a nós mesmos, a  negarmos sentimentos, a sermos fortes e ignorar a dor ou fragilidades, a valorizar o ter e não o ser entre tantas outras crenças e valores. Internalizamos tudo e passamos a acreditar em um mundo pronto que independe de nossa escolha ou vontade. Ficamos presos na uniformidade da realidade, pois ela é completa, pronta acabada. Nos acomodamos, nos sentimos insignificantes diante dela. Pensamos também que não podemos alterá-la. Vemos, portanto, apenas o que acreditamos ser possível.

 

E isso deve ser modificado. Mas então o que pode ser modificado?

Não existem regras prontas, acabadas, ou verdades absolutas. Nem ao menos regras para o que pode ou deve ser mudado. Mas podemos pensar as coisas como possibilidades. Modificar ou ampliar nossos ângulos de visão de percepção das realidades. Podemos escolher nossas próprias experiências, nossas direções a seguir e criar nossa própria realidade. A responsabilidade está em nossas mãos. O que acontece dentro de nós é o que vai acontecer fora de nós mesmos. Se a realidade é nossa própria possibilidade, então podemos alterá-la. Podemos criar e recriar nossa realidade.

O filme “Quem Somos Nós” retrata esta possibilidade. Busca mostrar uma visão mais ampliada, a posição do eu observador, o funcionamento da mente, das ações e reações, uma investigação das causas do sofrimento humano. Uma busca da distinção entre o que é real ou ilusório, observando que uma realidade não é estática, permamente, imutável. O mundo (coisas, objetos, pessoas etc) está em constante transformação, portanto é impermanente, modificável de acordo com a percepção pelos órgãos dos sentidos do observador (experiência individual) dentro de tempo e espaço em que vive, e pela sua ação e reação num dado momento. Um afastamento ou aproximação do olhar para a realidade observada, possibilita vários ângulos de visão da mesma realidade. Uma dada situação pode ser tida como falsa ou verdadeira, boa ou ruim, aumentada, diminuída e até mesmo significada ou ressignificada.

O único absoluto é o relativo, afirma Cláudio Azevedo. Constatando que os opostos não se excluem, mas fazem parte da mesma realidade. Que os condicionamentos corporais, mentais e até mesmo espirituais levam ao apego, à distorção da realidade, ao sofrimento.

O filme apresenta uma personagem  ainda presa a preceitos, a suposições, a modos de viver e de ver a realidade desta forma estática. A princípio, sem enxergar que pode criar novos padrões de associações dentro de seu cérebro. Sem aceitar novas verdades, resistindo. Aos poucos ela vai enxergando novas possibilidades. Vai praticando o eu observador e vai enxergando seus condicionamentos.

O caminho para a educação integral do ser passa por esta possibilidade de entendimento. De que o caminho a ser trilhado é cheio de percalços, com avanços e retrocessos, com involução e evolução.  Que deve ser percorrido de várias formas, todos os dias, todos os momentos, em constante processo de retro-alimentação. Uma constante prática do eu observador. Convivendo pacificamente consigo e com todos os seres existentes, estando junto, contribuindo para uma vida harmônica, um sistema integrado.  

Há portanto, que se pensar nas coisas como possibilidades, há que se ter posturas de escolhas e experimentação das realidades e de recriação da mesmas. Há que se pensar que o objetivo maior é a coexistência pacífica e harmônica entre todos os seres de todo o planeta. Uma verdadeira visão do todo. Um redimensionamento do modo de ver e tratar a parte e o todo. O todo precisa da parte assim como a parte precisa do todo para sua existência.

A Yoga, como uma maneira de viver, é uma técnica que facilita este processo. Uma verdadeira escuta de nossa consciência, de nossos sentimentos, de nossos corpos físico, mental e espiritual. É um dos caminhos, uma força de vontade ativa que trabalha corpo e mente em uníssono para a busca da extinção do sofrimento humano, para uma visão mais holística, para uma ação mais harmonizadora. Busca mudar dentro para mudar fora. Ensina a lidar com o impermanente, com o irreal, com as fontes de apego, entre tantas outras existentes, através da ação de acalmar a mente: meditação dirigida (visualização criativa, na respiração, na oração (mantras), na auto-análise, na ação (rituais, atividades diárias, nas artes maciais).

Ou seja, através dos ensinamentos provisórios – orientações morais e éticas para o bom convívio em sociedade e consigo mesmo – buscar a causa do sofrimento em nossos hábitos e visão de vida para transmutá-los. Buscar a compreensão dos paradoxos (certo e errado, bom e mal, macro e micro etc) como parte da realidade existente, do todo, do mundo, do vir a ser e modificar nossas posturas diante de cada situação.

Caminhar com a Yoga no sentido de reaprender os ensinamentos definitivos. Definitivamente nos assumir como seres não sofredores, como seres divinos criando seu próprio bem estar, longe de criar seu próprio sofrimento. O ensinamento definitivo é a verdade absoluta – a busca pelo todo, pela harmonia. E, dentro desta verdade absoluta, buscar aceitar as diferenças individuais – não há uma única forma de busca desta verdade absoluta. Existem vários caminhos e todos almejam transmitir conhecimento, criar códigos de conduta, uma ética e práticas em prol do humano.

Como nos ensinamentos do Yoga – uma busca pela verdade: Bhakti- yoga, Jnana-yoga, Karma-yoga, Raja-yoga e outras formas de yoga. O aspecto mais importante de todas as tradições, inclusive a yoga, é a busca de nossa essência, algo que nos é infinitamente superior e que nos habita, por trás de todos os nossos condicionamentos culturais e sociais. A busca do que nos faz semelhantes. Essa busca segundo Cláudio Azevedo é a busca da resposta à pergunta: quem sou eu.

Esta busca inclui, como já foi dito, a ampliação da mente, um afastamento da mente que categoriza para uma mente mais abstrata, que aceita a coexistência pacífica de várias verdades.

O estudo e a prática da Yoga é um dos caminhos que permite alcançar este objetivo. Uma integração corpo e mente em prol do humano. Um despertar do ser para uma consciência mais ampla, um processo evolutivo, uma integração homem natureza. Um enfoque vital que passa pelo orgânico, sistêmico, ecológico, integrativo.

 

Os caminhos yógicos – a prática da yoga pelo observador, não pela prática em si.

A conclusão, portanto, é que a Yoga pelo observador, segundo o autor, representa uma forma de ver o mundo, uma busca da essência humana, algo que lhe é superior e que o habita, por trás de seus costumes, por trás de seus condicionamentos. Explica que ela vai além da prática, estuda a mente e investiga as causas do sofrimento humano, sendo capaz de transmitir conhecimento, um verdadeiro código de conduta. Ela permite então,  não somente uma introspecção, uma percepção de várias realidades, mas um mergulho em níveis mais profundos de consciência através de uma metodologia prática e persistente, Uma verdadeira busca do eu. Uma reeducação corporal, postural, mental, espiritual.

O silenciar do corpo, das emoções, dos pensamentos, da alma. Silenciar tudo para conseguir penetrar no vazio, ouvir esse vazio. Usufruir da paz, da calmaria, da falta de julgamentos, da falta de controles, de tudo que ele proporciona. A presença na ausência, uma quietude infinita. Como diz Cláudio Azevdedo despojar de tudo, em silêncio, no vazio, com esperança, quietude, encontrar a felicidade suprema. O que para ele, é: estar presente no momento presente já é um presente.

Para o autor, acalmar a mente é uma atitude a ser buscada como benefício à saúde, pois leva o indivíduo para longe das perturbações cotidianas, liberta a mente do fluxo incessante de pensamentos e sentimentos negativos, das preocupações, ressentimentos, angústias, desapontamentos, raivas, etc. Como experiência pessoal, um relaxamento de dez minutos diminui sua concentração sérica de cortisol em 50%, durante todo o dia. Cinco minutos de relaxamento são mais eficientes que uma hora de sono, e podem curar 80% das doenças causadas pelo estresse. Os batimentos cardíacos, a pressão arterial, o ritmo respiratório e o metabolismo do corpo diminuem. Beta-endorfinas são produzidas e entram na circulação trazendo uma rápida recuperação da fadiga.

Para ele com a mente calma passamos a nos ver. Enxergamos onde há apego, onde precisa ser modificado, porque estou sofrendo. Passamos a mudar, a conhecer a saúde, a conhecer a paz, a deixar de ser do mundo e a passar a estar no mundo. A estar no momento presente e, portanto, sermos mais conscientes do corpo físico (sensações), do corpo emocional (nossas emoções), do corpo mental (nossos pensamentos) e inicia-se uma desidentificação de nossas sensações, emoções e pensamentos. Paulatinamente nos desconectamos dos prazeres mundanos, a paz nos leva ao ser divino que há dentro de nós, desaparecem todos os pensamentos e sentimentos negativos, conseguimos nos concentrar facilmente após treino constante. Há uma entrega total ao que é mais sagrado que é a busca da essência divina que há em cada um de nós. E por conseqüência o enfoque no ser orgânico, sistêmico, ecológico, integrativo.

Dessa forma, há uma modificação não somente a nível orgânico (trabalho das glândulas, na bioquímica do corpo etc) que traz bem estar físico mental e espiritual, mas possibilita ambiente propício a insigths,   a possíveis mudanças no modo de ser de agir no mundo, em modificações profundas no universo ao se redor alcançando distâncias inimagináveis.

O trabalho a nível espiritual fica claro através do princípios que o yogi deve seguir: Yama – conduta moral e Nyamas – conduta individual. Dos ensinamentos provisórios e definitivos.

 

OS PRINCÍPIOS DAS CONDUTAS MORAIS – os  YAMAS são:

·         Não ferir física ou verbalmente nenhum ser vivo (Ahimsa).

·         Ser verdadeiro sempre (pensamentos, palavras, ações) – (Satya).

·         Não cobiçar, nem tomar o que for alheio (Asteya).

·         Abandonar o desejo pela conquista e manutenção de bens materiais e relacionamentos afetivos com um sentimento de posse (Aparigraha).

·         Abster de sexo quando necessário para o crescimento espiritual (Brahamacharya).

 

OS PRINCÍPIOS DAS CONDUTAS INDIVIDUAIS – os NYAMAS são:

·         Manter puros os corpos físico, emocional e mental. Uma limpeza física através de técnicas mecânicas de purificação (Kriya), de respiração (pranayama) e posturais  (Asánas).

·         Obter um estado interior permanente de contentamento que independe de fatores externos (Samtosha).

·         Vencer, pela força de vontade, todas as limitações que nos surgirem (Tapas).

·         Buscar o conhecimento e a sabedoria do yoga e de si mesmo ( Svadhyaya).

·         Entrega total dos frutos de todas as nossas ações, dedicando-as todas a algo superior a nós mesmos (Ishvara Pranidhana).

Através dos ensinamentos provisórios tomamos consciência do nosso estado de sofrimento como real e procuramos a causa, os mecanismos de seu surgimento que estão em nossos hábitos, em nossa visão de vida. Esses ensinamentos a nos comportar no cotidiano, cria qualidades para que possamos controlar nossas paixões, nossas aversões.

Existem ainda todos os ensinamentos elencados abaixo que serão descritos posteriormente em outros trabalhos.

 

·         POSTURA CORRETA (Ásana);

·         CONTROLE DE PRANA (correntes vitais);

·         ABSTRAÇÃO DOS CINCO SENTIDOS DOS OBJETOS EXTERIORES (Pratyahara);

·         DE CONCENTRAÇÃO (Dharana);

·         DE MEDITAÇÃO (Dhyana);

·         DE EXPERIÊNCIA SUPERCONSCIENTE DE LIBERTAÇÃO (Samadhi).

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