Neuroquímica e Neurobiologia da Meditação

Introdução

A complexa tarefa mental da meditação, assim como os acontecimentos biológicos associados às experiências ritualísticas, têm sido algumas das mais importantes áreas de pesquisa das neurociências nestes tempos. A meditação, por exemplo, tem oferecido uma fascinante visão da consciência humana, da psicologia, da psicopatologia e da experiência vivenciada. A relação entre esta­dos mentais e a fisiologia corporal, o processamento cognitivo, volitivo e emocional, e as bases biológicas da experiência religiosa.

Desenvolvimento

Nos últimos 30 anos, os pesquisadores têm explorado os mecanismos biológicos envolvidos com o Yoga e com a medi­tação, sendo que muitos deles também estão se voltando para os efeitos da prece, as­sim como para a pesquisa de outras manifestações místico-religiosas, tais como as experiências de manifestação da consciência fora do corpo físico e as ex­periências de quase morte.

Os estudos iniciais realizados com meditação se pro­puseram a averiguar mudanças na atividade autonômica, tendo como foco a fre­qüência cardíaca e a pressão arterial, assim como as alterações eletroencefalográ­ficas. Estudos mais recentes têm explorado as alterações hormonais e imunológicas associadas à prática meditativa. Alguns estudos também têm di­recionado sua atenção aos efeitos clínicos da meditação, tanto nas patologias físicas quanto nas psíquicas.

As técnicas de neuroimagem têm aberto uma nova janela de investigação dos estados meditativos, pois facilitam a exploração dos aspectos neurológicos associados a essas experiências. Vários estudos, atual­mente, estão disponíveis na literatura, e alguns deles averiguaram a função en­cefálica durante técnicas meditativas. Tais estudos, apesar de empregarem téc­nicas de neuroimagem, diferem em alguns detalhes. Por exemplo, al­guns fizeram uso da Ressonância Magnética funcional (RMf), Tomografia por Emissão de Pósitrons funcional (TEPf), e Tomografia por Emissão de Fóton Único (TEFI).

Embora a RMf tenha habilida­de de produzir uma correlação anatômica imediata e apresente resolução melhor do que a TEFI, acaba sendo muito difícil adaptá-Ia de forma eficiente ao estu­do da meditação, devido aos ruídos produzidos pelo equipamento e a postura atí­pica para muitas formas de meditação. De forma geral, todas as técnicas empre­gadas apresentam vantagens e desvantagens. Muito provavelmente, logo teremos disponíveis equipamentos de neuroimagem mais ade­quados a este tipo de estudo.

As práticas meditativas variam mui­to entre as escolas que as empregam. Todavia, a maioria dos cientistas que atual­mente ocupa-se em pesquisá-Ias, dividem-nas em duas categorias básicas. A pri­meira categoria requer que o indivíduo se esforce em abstrair todo e qualquer pensamento de sua mente. Esta forma de meditação pretende que o praticante tente encontrar um estado consciencial no qual coexistam inúmeros vazios; no espaço, no tempo e nos pensamentos. Além disso, esta forma de estado cogni­tivo, quando experienciada, costuma ser relatada como altamente integrada e unificada com o universo ao seu redor. Estas práticas incluem aquelas associa­das com a tradição do budismo theravada, e podem ser encontradas também associadas ao zen-budismo.

A segunda categoria é aquela na qual os sujeitos fo­cam a sua atenção em um objeto em particular, como uma imagem, uma fra­se ou uma palavra, e pode ser encontrada na Meditação Transcendental, assim como nas várias formas do budismo tibetano. Esta forma de meditação leva o praticante a uma experiência subjetiva na qual parece existir uma absorção do próprio indivíduo no objeto focado.

Ainda existe outra distinção entre as formas de meditação, pois elas podem ser guiadas ou conduzidas pelo próprio praticante. Quando guiadas, geralmente apresentam um líder ou mesmo fazem uso de uma gravação. Os pesquisadores pertencentes à área de “neuroteologia” acreditam que a diferença também se reflita em díspares alterações na ativação encefálica. Todavia, talvez a medi­tação possa e deva ser dividida em muitas outras técnicas, como as que o Lama Oser empregou em seus estudos preliminares com o cientista Richard David­son e sua equipe associada.

Porém, análises fenomenológicas sugerem que, ao término da prática me­ditativa, a grande maioria das linhas acabe apresentando similaridades. Acredito que no meio do processo meditativo, apesar de algumas diferenças técnicas, o estado mental dos praticantes acabe convergindo para um padrão neuronal sin­gular. Até mesmo atividades não necessariamente clas­sificadas como meditativas, tal como as preces prolongadas, têm demonstrado padrões similares de ativação neuronal.

Estudos de neuroimagem sugerem que as tarefas que reque­rem uma atenção focada são iniciadas através da ativação do Córtex Pré-Fron­tal (CPF), particularmente no hemisfério direito. O giro cingulado parece es­tar envolvido na atenção focada, provavelmente em conjunto com o córtex pré-­frontal. Já que a meditação e a prece requerem um intenso esforço no foco da atenção, parece provável que estas práticas também se iniciem com ativação do córtex pré-frontal e do giro cingulado, no hemisfério direito. Esta noção é corroborada por inúmeros estudos. Porém, em no­vembro de 2004, Antoine Lutz, Richard Davidson e seus colaboradores encon­traram uma atividade maior no CPF esquerdo em budistas tibetanos renomados praticando a meditação da compaixão.

Voltando ao giro cingulado, sabe-se que este perfaz uma porção do córtex límbico que faz comunicação entre o CPF e as estruturas límbicas subcorticais, e exerce, dentre outras funções, a modulação da atenção e de algumas emoções. Al­guns cientistas realizaram uma pesquisa com oito praticantes de budismo tibeta­no (não tão experientes quanto os monges pesquisados por Davidson e Lutz), que tiveram suas atividades encefálicas analisadas durante o repouso e durante práti­cas meditativas.

No estado meditativo pôde-se apreciar um aumento na ativida­de do CPF e do giro cingulado, tanto no hemisfério direito quanto no hemisfé­rio esquerdo. Contudo, o hemisfério direito mostrou-se mais ativo. Desde que as áreas estejam associadas à vontade e à intencionalidade, parece lícito afirmar que estes são pré-requisitos para o início deste tipo de prática meditativa estuda­do: a concentração em um só ponto. Entretanto, um recente estudo mostrou um decréscimo na atividade do CPF durante uma meditação guiada através de pala­vras. Ao que tudo indica, a ativação do CPF e do giro cingulado estão associa­das às práticas meditativas auto-induzidas e não-guiadas.

Inúmeros estudos realizados com animais têm mostrado que o CPF, quan­do ativado, estimula o núcleo reticular do tálamo. Esta ativação requer a produ­ção e a distribuição do neurotransmissor glutamato. Este neurotransmissor é uti­lizado na comunicação entre os neurônios do CPF, assim como destes com outras estruturas encefálicas. A região talâmica tem inúmeras funções, dentre as quais aquelas que governam o fluxo de informações sensoriais para processamento cortical através de suas interações com o núcleo geniculado late­ral e o núcleo posterior lateral. E, muito provavelmente, o glutamato também es­teja envolvido nessas funções.

O núcleo geniculado lateral recebe informações visuais rudimentares do trato óptico e as redireciona para o processamento do córtex estriado. O núcleo posterior do tálamo comunica-se com o Lobo Parietal Posterior Superior (LPPS), concedendo-lhe informações sensoriais para que este produza uma percepção e orientação do corpo no espaço. Quando excitado, o núcleo reticular libera o neurotransmissor inibitório Ácido Gama-Amino-Butírico (GABA) no núcleo ge­niculado e no núcleo lateral posterior, impedindo que as informações atinjam o LPPS.

Durante a meditação, devido ao aumento da ativação do CPF, particu­larmente no hemisfério direito, é possível apreciar um concomitante aumento na ativação do núcleo reticular do tálamo. Entretanto, as técnicas de neuroimagem atuais ainda não são dotadas de uma resolução tão potente a ponto de distinguir pequenas regiões associadas a esses núcleos. Logo, a lite­ratura especializada tem afirmado que o aumento da atividade neuronal talâ­mica, a princípio, é geral e proporcional aos padrões de ativação do CPF.

Es­ses achados são consistentes, porém não confirmam a específica relação en­tre o CPF e núcleo reticular. Se a ativação do CPF direito causa um aumen­to da ativação do núcleo reticular durante a meditação, esse resultado deve produzir uma diminuição na entrada de informação do LPPS. Inúmeros estu­dos têm demonstrado aumentos nas concentrações séricas de GABA duran­te a meditação, possivelmente refletindo aumento na liberação central desse neurotransmissor.

Esta diminuição dos sinais aferentes ao córtex visual e ao LPPS pode es­tar relacionada à liberação do neurotransmissor GABA, o que significa dizer que uma quantidade reduzida de estímulos externos atinge tais áreas.

Outra questão que deve ser notada é que o sistema dopaminérgi­co associado aos gânglios basais deve estar envolvido na regulação do sis­tema glutamatérgico, assim como nas interações entre o CPF e áreas subcor­ticais. Um recente estudo fez uso do 11 C-Raclopride, um potente ligante dos receptores D-2 do sistema da dopamina (comumente usado em pesquisas de neuroimagem), com intuito de medir o tônus dopaminérgico duran­te uma meditação relacionada às práticas yóguicas.

Como o 11 C-Raclopride se liga aos mesmos receptores da dopamina, caso esse neurotransmissor fos­se liberado durante a prática meditativa, suas concentrações sangüíneas pode­riam ser facilmente medidas. E foi isto que o estudo demonstrou, um signifi­cante aumento nas concentrações de dopamina durante a prática de yoga-ni­dra, um tipo de relaxamento encontrado no Yoga. Futuros estudos, porém, são necessários para que se possa entender com mais clareza o papel da do­pamina durante as práticas meditativas, assim como suas interações com ou­tros neurotransmissores.

O LPPS está altamente envolvido na análise e na integração de vários es­tímulos externos. Através da recepção de estímulos auditivos e visuais vin­dos do tálamo, o LPPS é capaz de ajudar a gerar uma imagem tridimensional do corpo no espaço. Isto suscita coordenadas espaciais com as quais o corpo é orientado. Além disso, ele ainda pode fazer distinções entre objetos e exercer influências em relação aos mesmos objetos.

Tais funções do LPPS são críti­cas para que possamos distinguir nosso próprio eu do universo que nos rodeia. Deve ser notado, entretanto, que um recente estudo sugeriu que o lobo tempo­ral superior pode exercer uma função ainda mais importante do que a exercida pelo lobo parietal. Este fato diz respeito à representação de nosso corpo no es­paço, muito embora o estudo ainda não tenha sido corroborado por outras pes­quisas.

Uma parte da literatura atual propõe que a diminuição dos estímulos afe­rentes para estas áreas encefálicas destinadas à orientação espacial seja um im­portante conceito da fisiologia inerente às práticas meditativas. Se, por exem­plo, a diminuição dos estímulos aferentes para o LPPS de fato ocorrer, o indi­víduo em questão poderia perder o seu senso espacial habitual, e com ele a de­limitação do seu próprio eu no espaço.

Ao perder a noção de finitude espacial, a consciência poderia experienciar estranhos fenômenos. Este conceito pode ser associado aos interessantes relatos encontrados na literatura mística em ge­ral. Não raro, deparamo-nos com afirmações de transcendência, unificação com o todo universal etc. Afirmações similares geralmente vêm associadas aos te­mas que tratam da iluminação espiritual que, são chamados de sa­madi ou nirvana dentro da literatura oriental, ou ainda, estado de graça na tra­dição cristã. O cientista Andrew Newberg é um defensor desta analogia, mui­to embora alguns colegas seus acreditem que esta seja uma conclusão um tan­to quanto precipitada.

Os efeitos da meditação são provavelmente ainda mais seletivos e, em vez de destruir o próprio senso de individualidade, pode alterar sua percepção. A diminuição dos estímulos aferentes para o LPPS tem sido confirmada por traba­lhos que demonstram claramente este acontecimento.

Em adição à complexa relação entre o córtex e o tálamo, a meditação pa­rece alterar a atividade do sistema límbico. Tais estruturas, quando estimuladas artificialmente, parecem produzir experiências similares àquelas relacionadas com as práticas meditativas. É bem conhecida a relação do sistema límbico com algumas interessantes experiências mís­tico-religiosas.

O hipocampo age na modulação dos estímulos excitatórios corticais. Inú­meras vias neuronais partem do hipocampo em direção ao CPF, assim como para a amígdala e o hipotálamo. A estimulação do hipocampo diminui a res­ponsividade e a excitabilidade cortical, entretanto, se a excitação cortical é ini­ciada em nível baixo, a estimulação do hipocampo tende a aumentar essa ati­vidade. A habilidade do hipocampo para estimular ou inibir a atividade neu­ronal é dependente dos sistemas associados à liberação dos neurotransmisso­res glutamato e GABA, respectivamente.

A diminuição dos estímulos aferen­tes no LPPS direito, durante a meditação, pode também resultar da estimula­ção do hipocampo direito. Isto ocorre devido à relação de modulação exercida pelo hipocampo em relação à atividade cortical. Se, em adição, existir estimu­lação direta sobre o hipocampo direito via fibras glutamatérgicas advindas do tálamo (relacionadas ao sistema envolvido com a produção da atenção focada), uma poderosa estimulação do hipocampo direito poderá ocorrer. A atividade do hipocampo direito pode aumentar a estimulação do CPF sobre o tálamo via nú­cleo accumbens. O núcleo accumbens é uma massa de substância cinzenta si­tuada na união entre o putâmen e a cabeça do núcleo caudado. Alguns autores chamam esta área de corpo estriado ventral.

O hipocampo ainda influencia a amígdala, gerando emoções e alguns tipos de imagens. Assim, muito provavelmente, as modulações dos estímulos emo­cionais registradas no CPF devam ser feitas através de aferências vindas do hipo­campo, graças às suas conexões com a amígdala.

O hipotálamo apresenta extensiva rede de comunicação com o sistema lím­bico. Estimulações da amígdala lateral direita têm resultado na excitação da porção ventromedial do hipotálamo, com a subseqüente estimulação do sistema parassim­pático periférico. O aumento da atividade parassimpática pode ser associado com a sensação subjetiva de relaxamento e, eventualmente, a uma mais profunda inati­vidade. A ativação do sistema parassimpático também produziria reduções das fre­qüências cardíaca e respiratória. Todas estas respostas fisiológicas fo­ram exaustivamente detectadas durante a meditação.

No momento em que as freqüências respiratória e cardíaca são reduzidas, o núcleo gigantocelular da formação reticular diminui seus estímulos ao locus ceruleus da ponte. O locus ceruleus produz e distribui noradrenalina (NA). A noraedre­nalina é um neuromodulador que aumenta a suscetibilidade de algumas regiões en­cefálicas aos estímulos sensoriais, pois os amplifica sensivelmente. A diminui­ção dos estímulos no locus ceruleus resulta na diminuição das concentrações de NA.

Os metabólitos das catecolaminas, tais como NA, adrenalina e dopamina, têm sido en­contrados em menores quantidades, durante práticas meditativas, tanto na urina quanto no plasma. Embora este fato possa refletir simplesmente uma alteração no equilíbrio do sistema autonômico, as alterações não são inconsistentes com o decréscimo das concentrações encefálicas de NA. Durante a prática meditativa, a diminuição da atividade neuronal do núcleo gigantocelular da formação reticular provavelmente faz o locus ceruleus diminuir sua liberação de NA no LPPS. As­sim, a redução da NA diminuiria o impacto sensorial percebido pelo LPPS, con­tribuindo para uma menor percepção dos estímulos externos, alterando, assim, o senso do próprio eu no espaço.

Estes recentes achados científicos corroboram as afirmações encontradas nos yoga-sutras de Patañjali. São oito as partes que compõem o astanga-yoga, propos­to por Patañjali. A quinta parte é conhecida como pratyahara, ou abster-se dos sentidos. De fato, a diminuição da NA pode corroborar esta afirmação. Contudo, podemos hipotetizar que os acontecimentos neuronais decorrentes da me­ditação não necessariamente sigam a ordem preestabelecida do astanga-yoga. Tal­vez, as ativações e desativações de núcleos encefálicos ocorram de forma simul­tânea, sendo diferenciados com base na intensidade dos estímulos nervosos, as­sim como no número de neurônios envolvidos no processo.

Pode-se, ainda, hi­potetizar que os estados transcendentais conhecidos como samadi, ou consciên­cia cósmica, possam ter várias magnitudes. Partindo desta premissa, o praticante de meditação atingiria níveis cada vez mais profundos dentro do astanga-yoga. A cada meditação realizada, pratyaharas, daranas e dyanas mais elaborados seriam vivenciados, intensificando cada vez mais a prática do yogue. Porém, se esta pequena hipótese for confirmada no futuro, não diminuirá a grandiosa con­tribuição dada por Patañjali, uma vez que todos os seus pressupostos foram pro­postos há mais de 2000 anos, com base total nos processos intuitivos da mente humana.

Em alguns momentos, sou criticado por questionar afirmações de mes­tres tidos como perfeitos. Meu objetivo não é, e nunca foi, questionar cren­ças e intuições individuais. Acredito que tais crenças possam ser muito benéfi­cas em determinados momentos. Contudo, sou levado a discutir dentro do campo das idéias, abstendo-me da fixação em dogmas.

O locus ceruleus também ofertaria menor quantidade de NA para alguns nú­cleos do hipotálamo. Sabe-se que o hipotálamo é o responsável pela liberação do hormônio liberador de corticotropina (CRH), e isto é feito graças aos estímulos ad­vindos do locus ceruleus. O CRH tem como função primordial estimular a glân­dula hipófise anterior (adenohipófise), particularmente as células responsáveis pela liberação de adrenocorticotropina (ACTH).

Ele é o hormônio responsável por estimular o cór­tex das glândulas supra-renais a liberar cortisol, um dos principais hormônios associados ao eixo do estresse. A diminuição da NA libe­rada pelo locus ceruleus durante a meditação, provavelmente, deva ter efeito na di­minuição da liberação do CRH pelo hipotálamo. Levando isso em consideração, é lícito afirmar que as concentrações de cortisol também deveriam decrescer. Muitos estudos focaram-se nas concentrações plasmáticas do cortisol durante a meditação, tendo grande quantidade deles detectado uma sua sensível redução.

A diminuição da pressão arterial associada com os aumentos da atividade parassimpática durante a meditação deve diminuir a sensibilidade dos barorreceptores arteriais (pequenos sensores presentes nas artérias, destinados a controlar a Pressão Arterial), levando os núcleos do bulbo a diminuir a inibição gabaérgica do núcleo supraóptico do hipotálamo. Este fato pode provocar a liberação de mecanismos as­sociados à vasoconstrição, tal como a secreção do hormônio antidiurético Argini­na-VasoPressina (AVP). Isso reestabeleceria a Pressão Arterial aos seus valores nor­mais.

O AVP é um hormônio sintetizado nos núcleos supra-ópticos e paraventricu­lares do hipotálamo, sendo transportado até a hipófise posterior (neurohipófise), onde é, então, estoca­do. O sistema AVP também tem sido associado à diminuição da percepção da fadiga, assim como à consolidação de novas memórias e facilitação do aprendizado em ge­ral. De fato, as concentrações plasmáticas de AVP aumentam sensivelmente duran­te a meditação. Esta ocorrência poderia ser uma das responsáveis pelas sensações subjetivas relatadas pelos praticantes de meditação. Dentre elas, podemos citar: dimi­nuição da fadiga, melhora da memória e sensações de bem-estar geral.

À medida que a prática meditativa prosseguir deverá ocorrer uma ativida­de continuada do CPF, graças à persistência do praticante na focalização de sua atenção. Em geral, com o aumento da atividade do CPF, paralelamente aumen­tam as liberações de glutamato no encéfalo. O aumento do glutamato pode esti­mular o hipotálamo, mais especificamente o núcleo arqueado, responsável pela liberação da beta-endorfina.

A beta-endorfina é um opióide produzido prima­riamente no hipotálamo e distribuído nas áreas subcorticais encefálicas. Sabe-­se que este neurotransmissor produz depressão respiratória (existem inúmeros artigos sobre a detecção de períodos de apnéia espontânea durante a meditação), diminuição da dor, redução de sensa­ções associadas ao medo, além de produção de euforia. Todos estes efeitos também estão relacionados à prática meditativa, indicando provável liberação de beta-endorfina graças ao aumento da atividade do CPF. Entretanto, é prová­vel que a beta-endorfina não seja o único neurotransmissor responsável por esses efeitos, pois a ingestão de outras substâncias opióides não produz experiências equivalentes, e um único estudo demonstrou que o bloqueio dos receptores opiói­des com naloxona não afetou as experiências associadas à meditação, tampouco o padrão eletroencefalográfico comumente visto nesta atividade.

O glutamato ativa alguns receptores neuronais conhecidos com o nome de N-metil-d-aspartato (NMDAr), porém liberações excessivas de glutamato podem ser altamente nocivas para alguns neurônios. A literatura tem proposto que, se as concentrações de glutamato atingirem concentrações tóxicas durante intensos es­tados de meditação e, muito provavelmente prece intensa, o encéfalo deve limitar a produção da enzima responsável pela síntese de glutamato. O glutamato é produzido no encéfalo através da alteração química do N-acetil-aspartil-glutama­to (NAAG). Como resultado, a concentração encefálica de NAAG deve aumen­tar, e isto supostamente protegeria as células dos danos induzidos pelo glutamato.

Contudo, um importante efeito colateral pode vir à tona, uma vez que o NAAG é funcionalmente análogo a algumas substâncias alucinógenas, como a quetamina, o óxido nítrico ou a fenciclidina. A fenciclidina, por exemplo, é uma substância cristalina, hidrossolúvel conhecida nos USA como “Pó de Anjo”. A si­gla PCP é originária de seu apelido em inglês Peace Pill, ou Pílula da Paz. Algu­mas substâncias análogas foram introduzidas pela primeira vez como anestésicos gerais em seres humanos e animais.

Tais drogas permitem uma anestesia através de um estado dissociativo no qual a pessoa não está em coma profundo. Mas quando a fenciclidina foi usada como anestésico em seres humanos, ocorreram efeitos colaterais graves, como agitação e alucinações, fazendo com que seu uso fosse retirado do mercado. Posteriormente, a droga co­meçou a ser usada de forma ilegal, tornou-se amplamente abusada como alucinó­geno com vários nomes de rua. Existem relatos interessantes sobre grande varieda­de de estados conscienciais produzidos por essas drogas, alguns deles associados à esquizofrenia e outros a estados místicos, como experiência fora do corpo e expe­riência de quase morte.

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