“Quando a pessoa sente que o momento e a circunstância estão certos para se fazer algo? A ação não é sempre vantajosa, no sentido de que fazer algo é inevitavelmente melhor do que fazer nada. Às vezes não é” 1:77.
Omar Ali-Shah
Mestre sufi
“A experiência vivida sempre vem em decorrência do pensamento, embora estejamos acostumados a vivê-la e depois refletir sobre ela. Viver é arriscar-se, perceber o momento certo para exercer o seu direito de escolher.”.
Já vimos, anteriormente, que é o amor a energia atrativa que une todos os fragmentos e dualidades em direção à Unidade. Assim, paradoxalmente, o amor só existe enquanto existirem entidades separadas. Na Unidade o amor se transforma em Bem-aventurança, Ananda na filosofia vedantina: “dualidades e polaridades são essenciais à ativação do livre-arbítrio rumo a um potencial maior”. O nosso arriscar-se deve se dirigir nesse caminho de viver, em direção à Unidade.
E o que é se arriscar, o que é viver? Risco está intimamente ligado ao conceito filosófico de livre-arbítrio. Arriscar-se é exercer o direito filosófico de livre-arbitrar. O nosso livre-arbítrio pode nos levar a ficar preso a esse mundo “ilusório” ou nos livrar dele. Presos, poderemos experimentar sensações, emoções e os pensamentos lógicos, a elas associadas (bons ou ruins). Livres desse mundo, não há mais alegria ou tristeza, amor ou desamor, bondade ou ruindade, toda a dualidade desaparece e fica somente a Unidade, uma sensação que pode, muito imperfeitamente, ser comparada à sensação física de paz, interna e externa: a Bem-aventurança. Se sentirmos paz em nossos instintos, sensações, sentimentos, pensamentos e ações, então valeu a pena “nos arriscarmos a viver”. Se não sentimos ainda essa paz em todos esses planos, devemos mudar a nossa vida, tornar a nos arriscar e evoluir.
Vimos anteriormente que a mente está embutida em tudo e que tudo está interligado entre si, então o que acontece conosco é resultado de nossas escolhas individuais ou é conseqüência da ação externa de coisas que fogem ao nosso controle? Esses conceitos nos reportam aos conceitos de plano divino para a humanidade e o conceito de Carma gerado pelo livre-arbítrio. O que é o destino? Temos como decidir o nosso futuro, com o nosso livre-arbítrio, ou a nossa escolha já estava predeterminada? E se já estava predeterminada, quem a fez?
Uma das conseqüências das equações da relatividade de Einstein é a relatividade do tempo, que em resumo diz que presente, passado e futuro coexistem e são pré-determinados. Quando aumento a minha velocidade e me aproximo à da luz, o meu tempo pessoal passa cada vez mais lento, isso quer dizer que nessa situação tudo à minha volta vai passar mais rápido. Assim, na prática, viajo ao futuro e posso gravar em meu passado (na minha memória) coisas que ainda não aconteceram, mas que vão acontecer pois eu já as vi e já são meu passado.
Então toda mudança pessoal minha, e dos outros, já está “escrita nas estrelas”. Nessa situação nenhuma mudança é real, pois não há mudança mas apenas um desvio previsto de rota. Tal coisa não existe no mundo microscópico das subpartículas onde nada está determinado e, lógico, não pode ser previsto. Nessa situação a mente do observador tem um papel crucial no que acontece: a mente escolhe o que vai se “materializar”. Ou seja, aquela onda energética de probabilidades (o campo quântico) se torna uma subpartícula e ocupa o seu local no espaço-tempo (o colapso de onda), e todas as outras possibilidades de surgimento no espaço-tempo somem.
Até que ponto a nossa mente comum tem o poder de influenciar os eventos quânticos? E quando não influenciamos, quem ou o que os influencia? Aquilo que não observamos existe mesmo, ou tem apenas uma probabilidade de existir, passando a existir somente depois de observado pela mente humana? Ou é a mente que cria a observação? Se o nosso destino foi irremediavelmente traçado pelo evento do Big-Bang (que gerou um Universo de partículas interligadas segundo o teorema de Bell – Cf. no Volume 1), quem, ou o que, desencadeou essa explosão? Porque as coisas acontecem?
Complicadas questões filosóficas. Evoluções históricas à parte, o homem tem três formas de pensar acerca dessas perguntas: afirmar que as coisas acontecem ao acaso, afirmar que há uma lei que determina os acontecimentos ou afirmar que “temos as rédeas na mão”. Por séculos a ciência se dividiu nas duas primeiras formas de pensar que se desenvolveram independentemente em dois ramos bastante sólidos: a estatística e a matemática. O pensamento ocidental conciliava perfeitamente o que é estatístico (entregue ao acaso) e o que é matemático (entregue a leis) até que a descoberta do comportamento da subpartículas incluiu a mente humana como um fator influenciador dos eventos quânticos.
Trazendo para o nosso dia-a-dia, diante de uma situação qualquer sempre teremos um “campo quântico” de possibilidades de resposta, mas iremos escolher apenas uma (um colapso de onda) e todas as outras sumirão. No momento seguinte teremos então diversas outras possibilidades, inclusive de desfazer o que escolhemos, e de repente “bum”: outro colapso de onda. Em física quântica, a existência teórica de universos paralelos, que nos faz pensar em um multiverso e não em um universo, nos explica o que pode acontecer com todas as outras infinitas possibilidades de reação (ou, no mundo quântico, de colapso de onda): elas colapsam simultaneamente nessas outras dimensões.
Então seríamos seres multidimensionais, em que infinitas partes nossas vivem todas aquelas escolhas que rejeitamos. E na verdade, todas as possibilidades são escolhidas e todas ocorrem simultaneamente, em múltiplas dimensões, mas a nossa consciência ordinária percebe e vivencia apenas uma. Assim, cada reação nossa envolve uma percepção diferente e uma vivência de nossa consciência em uma dimensão diferente. Quando, conscientemente, percebemos duas opções de interpretação de uma mesma situação em nossas vidas, viajamos entre duas dimensões psíquicas, tão reais quanto as dimensões postuladas pela física moderna.
É uma viagem interdimensional real de nossa consciência entre duas dimensões físicas nossas, fato que está sendo pesquisado seriamente por renomados físicos. Nessa investigação já se conseguiu até fazer com que uma mesma molécula tivesse presença física, simultaneamente, em mais de um lugar diferente. Então, ter uma mudança de percepção seria viajar interdimensionalmente (que realidade fantástica!), viagem feita por nossa consciência. É ela quem escolhe em qual dimensão física viver: a de dor e de sofrimento ou a de felicidade e bem-aventurança. Nessa perspectiva, não é a partícula que surge, mas é a nossa consciência que viaja para uma dimensão em que ela tem existência real naquele local e momento.
Quanto mais formas de percepção formos capazes de ter (quanto maior for a nossa visita a outras dimensões psíquicas), maior o leque de opções que a nossa consciência tem para escolher. O ato de tirar nossa consciência do espaço-tempo, fazendo outras coisas e interagindo com outras histórias, é a forma mais simples de não se aprisionar àquela situação de sofrimento. Mas uma forma mais elaborada é “parar o tempo” e visitar outras dimensões, universos de possibilidades, e a partir daí, escolher onde queremos ficar. Essa viagem, essa mudança de percepção e essa escolha são feitas por aquela parte nossa que transcende o nosso corpo, as nossas emoções e os nossos pensamentos. Essa viagem é feita pela nossa consciência. Vivenciar essa possibilidade é experimentar uma ampliação de nossa consciência, que passa a abranger cada vez mais possibilidades de ser, existir e escolher.
Na realidade, parece que o tempo codifica e joga com a informação, permitindo acesso a diferentes realidades quando esticado, distorcido ou curvado. Pode-se seguir uma curva elíptica de tempo e vivenciar múltiplas realidades, e assim descobre-se que ambos, tempo e realidade, não são “sólidos”. Desse modo podemos entender que o futuro não está determinado, pois é apenas um número probabilístico. Se podemos mudar o nosso futuro, pois ele é apenas uma possibilidade e não tem existência absoluta, poderemos também mudar o nosso passado, que não tem também uma existência absoluta?
No campo religioso, dogmas inflexíveis separam as doutrinas que pregam a predestinação absoluta do homem ou a sua salvação através de seu livre-arbítrio ou pela graça de um Ser superior. Mas da mesma forma que os estados de matéria e energia, como pólos opostos da subpartícula, são verdadeiros, todos os pólos opostos também são verdadeiros e plenamente reconciliáveis. Parece haver algo como uma “Mente” ou “Consciência Universal” responsável pela Criação, que quando sintonizada pela mente humana, em estados ampliados de consciência, faculta ao homem o poder de modificar a matéria no tempo e no espaço. Se a única coisa real que existe é o “aqui e agora”, temos o poder de modificar a nós mesmos e, conseqüentemente, pelo teorema de Bell (Cf. no Volume I), todo o Universo sincronizado conosco.
Assim, parece que temos o poder de realizar e mudar o estado das coisas, mas para isso necessitamos sintonizar o nosso “rádio mental” (parafraseando Paramahansa Yogananda) no canal divino da “Consciência Universal”. Enquanto estivermos sintonizados com o nosso mundo finito de pensamentos, emoções, sentimentos e sensações, não experimentaremos nenhuma mudança substancial em nós mesmos e muito menos no Universo a nossa volta. Sintonizar o nosso “rádio mental” no silêncio que está além de nossos pensamentos, emoções, sentimentos e sensações é experimentar o vazio da meditação. É no vazio físico que todas as partículas surgem e desaparecem, e é no vazio mental que as transformações pessoais ocorrem. Somente quando a nossa mente está vazia é que a voz do silêncio de nossa intuição consegue se fazer audível na forma de insights ou de impulsos criativos e artísticos.
“Em toda a criação não há nada que se assemelhe tanto a Deus como o silêncio” 74:234
Johann Eckhart (1.260-1.328)
Nos resta apenas trabalhar e buscar o vazio dentro de nós, única oportunidade teórica de mudança, demonstrada na prática na vida de todos as pessoas consideradas santas, ou espiritualizadas, que viveram ou que ainda vivem entre nós. O “não escolher”, o “não agir”, seria a escolha mais apropriada. Entregar a vida a Deus (wu-wei taoísta), mas estar atento às oportunidades. A escola sufi Naqshbandi chama essa atenção às ocasiões e oportunidades de agir ou não-agir, de “observar os passos” (Nazar ba Kadam) 1:77: perceber os momentos apropriados para a ação, para a pausa (reflexão) e para a inação.
Devemos ajudar a mudar o mundo, mudando a nós mesmos. A chave está na escolha. A ausência de controle e uma forte intenção fazem reais os milagres. A clareza de propósitos, que criará a nossa realidade, é dependente de se ter uma mente clara e centrada, que vive no momento presente, evitando deter-se no passado ou no futuro. Quando paramos e nos perguntamos o que na realidade estamos querendo naquele exato momento, esse é o comando necessário para a realização, a qual virá num ritmo acelerado. Precisamos aprender a pedir o que queremos da vida e abolir frases como “eu queria…” ou “estou tentando…” e utilizar frases como “eu quero…” ou “estou fazendo…”.
Da mesma forma, precisamos também assumir a responsabilidade por tudo em que estamos envolvidos e por tudo o que acontece conosco. Nesse momento começamos a nos perguntar porque criamos coisas que não gostamos, e percebemos que talvez assim o façamos para chamar a nossa própria atenção para coisas que não conseguimos ver e assim poder mudar o que realmente não funciona em nós. Começamos a perceber e agir como se cada evento estivesse ocorrendo para nos impulsionar ao crescimento, afinal cada coisa que nos acontece é uma parte nossa que foi materializada: criamos a nossa própria realidade.
Atraímos para a nossa vida dramas de acordo com os dramas que estamos acostumados a utilizar, e assim andamos em círculos, quando na realidade deveríamos andar numa espiral ascendente. Quando adotamos uma postura de vítima (coitadinho de mim) enviamos ao Universo, e às outras pessoas, a mensagem energética de que somos fracos e impotentes, e influenciamos uns outros a se sentirem também fracos e impotentes. Então alguns respondem nos dominando e outros se sentindo vítimas como nós.
Mas não podemos nos esquecer que muitas vezes as maiores iluminações surgem das maiores catástrofes e dificuldades e que muitas pessoas, que parecem ser vítimas indefesas, talvez estejam passando por isso para despertar em si algo de que necessitem. Talvez estejam congeladas em seus sentimentos, necessitando de algo para que comecem a sentir e se abrir para as dimensões suprafísicas do sentimento, da emoção e da espiritualidade. Devemos aprender a respeitar os dramas das outras pessoas, pois elas podem estar precisando atravessar densas trevas para poderem chegar à luz.
Na hora que compreendemos o nosso poder, passamos a realizar as coisas sem esforço, interligados que ficamos à teia da vida. As sincronicidades se encarregarão da tarefa de realizar e nós, plenamente atentos e vivendo no presente, perceberemos as oportunidades que o Cosmos mandará em resposta às nossas intenções e vontades. Realizar sem esforço não desmerece a realização, “realizar sem esforço é comandar a realidade para que ela se ofereça de uma forma mais econômica energeticamente e permita a expansão de muita energia para outras experiências”.
A vontade consciente é também chamada de várias formas, de fé consciente a manipulações fluídicas, indução, concentração, etc.. A fé constitui-se na aceitação de algo como verdadeiro, no infinitesimal instante presente, sem que dúvidas pairem na mente (Mc 11:23s). Qualquer coisa que se imprima no subconsciente irá se expressar no tempo e no espaço como condicionamento, experiência e acontecimento. Mas a ação se faz necessária perante a fé. A lei da mente é a lei da fé. Isso significa acreditar na maneira pela qual sua mente funciona, acreditar na própria fé. Não é aquilo em que se acredita mas a fé em sua própria mente que traz os resultados.
Mas “vivemos” nossos anos na Terra como marionetes, como uma nau à deriva no mar de diversos estados de consciência, os quais nos chegam e nos deixam sem deixar nenhuma memória ou percepção consciente do que eles nos causam ou do que vivemos enquanto imersos nele. Somos sonâmbulos que acham que são conscientes: