Niyamas

??vara Pra?idh?na

Quando se chega ao estágio em que o buscador começa a perceber, dentro de si mesmo, a existência de uma Sabedoria que lhe é superior, ele se torna apto a perceber verdades às quais ele nunca conseguiria, por si só, conceber. Começa a perceber sua cegueira, perceber que seus desejos pessoais, os desejos de seus ko?as, foram meras ilusões causadoras de sofrimento e que avidy? (ignorância) sempre esteve por detrás das suas ações. Quando percebe isso tudo muda.

Adicione a isso, o fato de que o buscador começa a desenvolver sua percepção para outros níveis de consciência, passando a perceber outras interpretações para os mesmos fatos que antes ele interpretava como fontes de dor. O mundo começa a se apresentar mais belo e ele passa a aspirar mais fortemente pela ampliação dessa percepção, com o despertar pleno da verdadeira Vontade Espiritual proveniente de nosso verdadeiro Eu (?tman). É a Vontade Espiritual, guiada pela Sabedoria de buddhi, que levará o buscador à Auto-realização.

Esta é a razão pela qual desenvolver sa?to?a (contentamento) é tão importante, pois abre um canal psíquico para que floresça, no seu íntimo, uma sensação de segurança e confiança de que a vida segue o seu curso obedecendo a leis naturais e que todo esforço para a auto-superação deve ser conquistado sem ansiedade. Passa-se a empenhar a própria vontade em fazer o melhor e deixamos os resultados ao encargo de um poder maior, neutralizando a tensão das expectativas: uma reta orientação para o Real.

Essa entrega é ??vara pra?idh?na. Enquanto membro de kriy?-yoga?, vimos que ??vara pra?idh?na significava colocar-se completamente no mais profundo estado de consciência (??vara), numa postura de ampla auto-entrega, que insere o buscador na esfera de vair?gya (desapego ao visto e ao não visto). Já aqui, enquanto membro de niyamas, significa uma completa e difícil resignação à vontade desse Poder Maior (??vara) que muitos chamam de Senhor Deus, e o exercício dessa entrega é um exercício plenamente devocional.

Quando a consciência está tranqüila por ter tentado tudo e ainda assim não se haver conseguido o resultado ideal, ou quando estamos literalmente impossibilitados de obter melhores resultados, esse é o momento de entregar o fruto das nossas ações a uma Vontade maior que a nossa, cujos desígnios muitas vezes são incompreensíveis. Para aqueles com uma personalidade harmonizada (sattva) isso é obtido facilmente, mas para aqueles ativos (rajas) e preguiçosos (tamas), o fatalismo e a displicência, respectivamente, são deturpações de ??vara pra?idh?na.

Na estrada da vida só existem passageiros e motoristas. Chega um momento em que percebemos que éramos como passageiros que achavam que eram motoristas, mas que havia um Eu sempre tentando dirigir-nos a vida. É nesse momento que começa a surgir, em nosso íntimo, uma profunda admiração, devoção e puro amor (prema). Nunca estivemos sozinhos e sempre houve, em nosso íntimo, esse Ser que, amorosamente e pacientemente, sempre nos observou e se importou com o que estivemos fazendo e pensando.

“Eu não sou eu, eu sou alguém que caminha ao meu lado. E por esse Alguém, vale a pena conspirar…”

Roberto Crema

Liderança no Século XXI – Impactos da Passagem do Milênio.

Mas o buscador não poderá desenvolver a perfeita devoção se estiver apegado aos objetos de adoração deste mundo, se estiver influenciado pelos encantos das coisas mundanas, se desejar tomar conta de sua esposa, crianças e parentes, se desejar satisfazer os seus desejos, se desejar ganhar grande nome no mundo, se desejar edificar fama permanente por sobre a Terra, se não quiser abrir mão das seduções e contentamentos terrenos. O perfeito desapego (vair?gya) a todos os objetos mundanos é o produto do amor puro que nasce da perfeita devoção e só conhece o amor puro quem é totalmente desapegado.

??vara pra?idh?na significa pousar todas as nossas ações aos pés Daquele que percebemos ser o nosso Senhor. Passamos, paulatinamente a perceber que sempre vão existir os desejos dos ko?as e a vontade do Eu, e, em conseqüência, começa a diminuir nossa auto-identificação, produzindo uma gradual fusão da vontade egóica com a vontade superior, que é percebida pela mente superior. Assim, ??vara pra?idh?na é um grau superior de contentamento, pela submissão pessoal do desejo do ego aos desígnios e aspirações da Vontade Divina.

Passamos a exercer nossa força de vontade passiva, a verdadeira força de vontade espiritual, que é quase uma entrega, é um querer confiando, é um deixar acontecer. Deseja-se o fruto do trabalho, mas sem uma luta obsessiva por ele. É como se não o quiséssemos, estando totalmente desapegados dele e isso nada mais é do que ni?k?ma karma: a consumação do caminho no Karma Yoga.

É uma evolução do 'desejar' para o 'aspirar'. À medida que a energia do desejo se despe de seu elemento pessoal, egoísta e impuro, aproxima-se da Vontade Espiritual pura. Logo, a posse de uma forte natureza de desejo é muito importante, pois quando se destrói a cobertura personalística, o Eu assume o comando de uma enorme energia e poder de Vontade Espiritual: “quanto maior o pecador, maior o santo”. A partir de então a ação passa a ser realizada através da personalidade e não mais por ela.

Quando surge a aspiração surge a devoção do eu inferior por aquilo que lhe é superior e todas as ações, durante todo o dia, são oferecidas ao Eu num estado de contínua adoração e perpétua festa de amor. E quanto mais amor nosso ego percebe se manifestando em si, mais devoção e adoração surgem fazendo com que, cada vez mais, ele se sinta como instrumento dessa Vida e Amor divinos e que esse aspecto divino, sediado em nosso coração (h?daya) YS III:35, sempre esteve tentando dirigir-nos a ação, num fluxo de vida divina à qual nós estamos agora totalmente submetidos: estamos plenamente felizes em servir como instrumento aos desígnios do Eu. Essa é a mais alta meta do Bhakti Yoga.

“Refugia-te nele, invoca o seu auxílio, a ele te entrega com toda a alma – e por sua graça alcançarás a paz, a suprema beatitude na tua vida”. BG 18:62

Bhakti vem da raiz sânscrita ‘bhaj’, que significa ‘separar’, no sentido de ponderar sobre as aparentes razões de nossos sentimentos de separatividade ou saudade. No ?r?mad Bhagavatam e no Vi??u Pur??a são ordenadas nove formas de Bhakti, que são:

  • ?ravana (escutar os L?l?s e histórias de Deus);

  • K?rtana (cantar Suas glórias),

  • Smara?? (lembrança de Seus Nomes e presença);

  • Padasevana (servi-Lo a Seus pés);

  • Arcana (adorar a Deus);

  • Vandana (prostrar-se para o Senhor),

  • D?sya (cultivar o Bhava de um servo de Deus);

  • Sakhya (cultivar o Bhava de amigo) e,

  • ?tmanivedan? (completa rendição ao Ser).

         Um devoto pode praticar entre esses métodos de Bhakti o que melhor combina com ele. Através deles ele conseguirá obter a Divina iluminação. Segundo o sutra 82 do Bhakti S?tra de N?rada Mun?:

“Ainda que Bhakti seja una, ela se manifesta de onze formas de ligação, a saber: Gu?a m?h?tmy??akt?, ater-se nas gloriosas qualidades; R?pa?akt?, ater-se à forma; P?j??akt?, ater-se à oferenda; Smara???akt?, ater-se em lembrar-se; D?sya?akt?, ater-se como servo; Sakhy??akt?, ater-se no sentimento de amigo; V?tsaly??akt?, ater-se no sentimento de pai e mãe; K?nt??akt?, ater-se no amor ardente pela consorte; ?tmanivedan?, ater-se na sensação de Si-mesmo; M?y??akt?, ater-se na auto-rendição elevada; Viraha?akt?, ater-se no sentimento de separação ou saudade”.

            Com a prática, quanto mais perfeito em ??vara pra?idh?na o buscador se torna, mais ele se torna apto a atingir um estado de profundo êxtase espiritual em que ele perde a percepção do próprio corpo e torna-se capaz de, num profundo estado de consciência, permanecer em completa paz e tranqüilidade. Em outras palavras, estando firmemente estabelecido em ??vara pra?idh?na, o buscador alcança a superconsciência (sam?dhi) YS II:45 e YS I:23.

BIBLIOGRAFIA

  • As referências bibliográficas acham-se assim indicadas: xx:yy, onde ‘xx’ é o número da referência contido na BIBLIOGRAFIA (no final do livro) e ‘yy’ é a página onde se encontra.

  • Quando precedendo ‘xx’ estiver escrito YS, a obra referenciada é o Yoga S?tra de Pat?ñjal?, BG quando for Bhagavad G?t?, VC quando for o VivekaCh?d?mani, TB quando for o Tattvabodha? e SS quando a obra referenciada for o?iva S?tra (obra de referência no ?ivaísmo de Cachemira). Nesses casos ‘xx’ é o capítulo e ‘yy’ é o s?tra.

  1. Azevedo Cláudio; Yoga e as Tradições Sapienciais, Órion Edições, 2ª Edição, Fortaleza, 2.006;

  2. Os Upanishads; 9a Edição, Editora Pensamento, São Paulo, 1.999;

  3. Satyananda, Paramahansa; Four Chapters on Freedom; Bihar School of Yoga, Bihar (India), 1.979;

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