Pr???y?ma


Por Cláudio Azevedo

Extraído de Azevedo, Cláudio; A Caminho no Ser: Uma Visão Transpessoal

da Psicologia no Yoga S?tra de Pat?ñjal?, Editora Órion, Fortaleza, 2.007

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Parece que o efeito de serenização da mente obtido através de uma imobilidade corporal relaxada e confortável (?sana) ocorre pela influência que essa imobilidade exerce no padrão respiratório. A imobilidade que repousa na espiral infinita (ananta) acalma e aprofunda a inspiração (p?raka) e a expiração (recaka) e, por conseguinte, essa respiração acalma as modificações da mente (citta-v?tti).



A Caminho no Ser?y?ma significa ‘expandir’ ou ‘alongar’ e pr??a refere-se ‘àquilo que está infinitamente em todo lugar’, fluindo continuamente de algum lugar dentro de nós, animando-nos e mantendo-nos vivos. Pr???y?ma é o expandir o fluxo de nossa energia vital, concentrando-o dentro de nosso corpo. Esse fluxo de pr??a está intimamente ligado ao fluxo e qualidade da respiração, o que, por sua vez, influencia o nosso estado mental.

“Uma pessoa doente ou agitada desperdiça para fora do corpo porque há bloqueios impedindo o fluxo do pr??a internamente. Uma pessoa em paz e saudável mantém mais pr??a dentro do corpo… ‘iogue é aquele cujo pr??a está todo dentro do corpo’. Pr???y?ma é reduzir a quantidade de pr??a fora do corpo, até que não haja nenhum desperdício” 16:101.

T. K. V. Desikachar

A influência da respiração no padrão de reações mentais e na saúde do corpo físico energético já é bem documentada no Ha?ha Yoga, como praticado no Yoga preliminar. Ao buscador iniciante é ensinada a técnica da respiração profunda como forma de aumentar a oxigenação corporal e o fluxo de energia vital (pr??a), pois não apresentam nenhum grande perigo para ele. Para a Bioenergética, corrente psicoterapêutica criada por Alexander Lowen, a prática da respiração profunda é essencial como forma de se desconectar do ego e dos medos.

A prática da respiração profunda, embora automática nas crianças, é paulatinamente perdida à medida que vamos bloqueando nossas emoções. Prender a respiração é o método mais eficaz de bloquear a percepção de nossas dores emocionais e mentais. Por isso a importância da respiração profunda na fase preliminar do caminho, para fins de autoconhecimento.

Mas, ao praticante mais experiente de Ha?ha Yoga são ensinadas técnicas mais avançadas que interferem nas correntes de energia vital (pr??a), limpando os canais sutis de energia (n???s), como o n????odhana pr???y?ma, ou suas variantes: o anuloma pr???y?mae o pratiloma pr???y?ma. No início, essas técnicas são ensinadas sem pausa respiratória (k??bhaka), com uma relação inspiração-expiração de 1:2, para serem repetidas até 30 ou 40 vezes. Só posteriormente é que se incluem as pausas respiratórias.

Essa prática visa tomar o controle consciente do processo expiratório, normalmente mais rápido que a inspiração. Essa prática desfaz os bloqueios energéticos mais sutis (n??? ?uddhi) e ajuda na purificação de nossos envoltórios físico-energético e vital. Enquanto esses canais não estiverem completamente desobstruídos ao fluxo de energia vital, surgirão diversos sintomas e perturbações, como palpitações, ansiedade e uma inquietação física e mental que só serão superados pela prática regular e persistente.

Devemos ter em mente que nesse ponto, já considerado como aspirante, o buscador já cumpriu diversas etapas:

·         Está consciente, pela auto-observação, de suas auto-identificações, geradoras de seus desejos, raivas e medos;

·         Já é capaz de observar a si e ao mundo de outra perspectiva menos egóica, ponderando nos opostos;

·         Já consegue discernir o que fazer e quando fazer;

·         Já consegue realmente agir, de acordo com o seu discernimento, através do convencimento amoroso de si mesmo;

·         Em conseqüência, já atenuou seus hábitos e tendências egóicas e construiu uma nova forma de ser e estar no mundo;

·         Adquiriu saúde física e emocional e serenizou sua mente, ou seja, já domina a prática do Yoga preliminar (kriy?-yoga?) e dos três primeiros membros do a????gayoga;

Com esse domínio, Pat?ñjal? prescreve, ao aspirante no caminho de ‘Busca do Eu’, um nível mais adiantado de exercício respiratório, que serenize os níveis mais sutis da mente pela total cessação da respiração, prática definida pelo termo pr???y?ma YS II:49. Para ele, essa cessação tem vários níveis de execução: após a inspiração (antara?ga k??bhaka), após a expiração (bahira?ga k??bhaka) ou a qualquer momento durante esses movimentos respiratórios.

Cessar conscientemente a respiração implica que já conseguimos respirar de uma forma totalmente consciente. Significa que estamos continuamente alertas e perceptivos de seu fluxo através dos movimentos respiratórios corporais torácicos e/ou abdominais, da sensação desse fluxo nas narinas e/ou faringe ou pela audição de seu som na laringe, quando restringimos discretamente sua passagem por esse local, na técnica conhecida como ujj?y? pr???y?ma.

Num primeiro estágio, essa cessação voluntária e temporária da respiração, por alguns segundos, pode acompanhar as técnicas citadas acima, do Ha?ha Yoga (o n????odhana pr???y?ma, o anuloma pr???y?ma e o pratiloma pr???y?ma), e ser aumentada em seu tempo, paulatinamente. Embora Pat?ñjal? não forneça detalhes, ele diz que esses exercícios podem variar quanto ao espaço (percorrido – visualização mental do fluxo da energia vital nos canais sutis), tempo (de cada fase respiratória) e número (de repetições).

Pat?ñjal? ressalta também a importância da profundidade e da sutileza da respiração YS II:50, de tal forma que a respiração se torne tão profunda que seja totalmente imperceptível externamente. O domínio de k??bhaka atinge-se quando se consegue respirar apenas uma ou duas vezes por minuto, de uma forma tão profunda quanto imperceptível.

Parece que a prática mais segura, conhecida como la?ghana, é expirar profunda e lentamente e aguardar que a inspiração surja livre e espontaneamente, de uma forma totalmente autônoma e sem o controle mental. Ao contrário, se tiver que haver algum controle mental ele tem que se dar durante o movimento expiratório, que deve ser o mais lento possível. Dessa maneira, se alguém colocar um espelho diante de nossa face não notará nenhuma condensação.

Embora recomendada como meio de energizar e aquecer o corpo físico, a prática contrária de prolongar a inspiração ou reter a respiração após ela, conhecida como b?mha?a, apresenta potenciais malefícios, alertados por quase todos os estudiosos, pois ‘muito fogo sem eliminação pode criar padrões de energia perturbados’ 16:78. Como regra geral, se a retenção respiratória ocasionar a redução do tempo inspiratório ou expiratório da próxima respiração, o buscador ainda não está pronto para a prática e é melhor pará-la.

Mas, como quarto membro do a????gayoga, pr???y?ma consiste numa continuação da prática de ?sana. Nessa prática, quando se permanece imóvel, relaxado e sentindo a espiral ascendente a partir da base da coluna, alcança-se, concomitantemente, a serenização mental e uma retenção temporária natural da respiração depois da expiração YS I:34. Alcançada essa fase espontânea e embriagante já se pode incluir também a visualização do fluxo de energia vital (pr??a) durante p?raka, recaka e até k??bhaka.

Livre da percepção da existência de um corpo físico-energético, o aspirante inicia a visualização da energia vital, ascendendo junto com a espiral e acompanhando ritmicamente a respiração. Essa manipulação mental da energia vital, com tempo e dedicação (abhy?sa), deve produzir uma percepção das correntes de pr??a (com suas sensações de calor e frio) percorrendo os canais sutis do corpo e da coluna vertebral.

Essa percepção do fluxo prânico através da coluna vertebral (n??? su?um??) produz, invariavelmente, o despertar de ananta YS II:47 (ku??alin? ?akt?), com perigos potenciais para aqueles curiosos que não passaram por todo o preparo prévio necessário, devido a inúmeras repercussões psíquicas e parapsíquicas que a prática de pr???y?ma traz. Essa energia espiral, armazenada na contraparte sutil de nossa coluna vertebral, é centenas de vezes maior do que a energia física que gastamos no cotidiano. Por isso só devemos despertá-la quando estivermos prontos para manipulá-la.

Na realidade, pr???y?ma é o controle do fluxo do pr??a através do controle do fluxo respiratório. Pr??a é uma energia sutil de base física, mas completamente diferente de todas as outras energias físicas que atuam no corpo físico. Ela é como uma interface entre a mente e o corpo físico-energético denso (annamaya? ko?a) e dá forma ao envoltório (ko?a) físico sutil denominado pr??amaya? ko?a. Esse veículo de manifestação da consciência interpenetra annamaya? ko?a, como um ‘corpo fantasma’, e atua conjuntamente com ele.

Para que se obtenha aquele referido controle, faz-se mister que primeiro conquistemos a capacidade de tomar consciência do pr??amaya? ko?a. Para isso, enquanto imóveis na prática de ?sana, podemos praticar a mentalização de movimentos sem executá-los, o que pode ser facilmente executado em estado de profundo relaxamento. Essa prática, essencial para termos êxito em praty?h?ra, nos faz sentir como se o nosso corpo físico fosse maior do que realmente é. Essa sensação é o início da percepção consciente do pr??amaya? ko?a.

Depois de se conseguir uma postura estável, uma serenidade mental, um acalmar profundo da respiração e o domínio da percepção de pr??amaya? ko?a, ou concomitante com essa prática de percepção, deve-se iniciar a prática do direcionamento consciente da energia vital (pr??a), concomitantemente com o fluxo respiratório, para qualquer parte do corpo que se deseje: é um preparo para o próximo passo. Esse exercício visa controlar a energia vital que ativa os pulmões, de forma a se poder dominá-los e ocorrer uma supressão natural e involuntária da respiração YS II:51 (kevala k??bhaka) que, em sam?dhi, pode durar várias horas.

A diminuição e supressão dos movimentos respiratórios causa uma natural diminuição e supressão dos batimentos cardíacos. O domínio de pr???y?ma é a capacidade de retirar conscientemente a energia vital da respiração, como no sono (na postura do morto – ?av?sana), sem desuni-los da mente consciente. Todos os avanços conseguidos até agora sempre visaram, na realidade, a obtenção desse domínio.

Quando for obtido esse domínio, pode-se retirar a energia vital de qualquer função do corpo à vontade para poder praticar o profundo silêncio, que nos mostrará o nosso Eu. Outra conquista (siddhi), que vem depois do despertar de ananta, e conseqüente ativação dos vários centros psíquicos sutis (cakras), é a percepção consciente da luminosidade YS II:52 emitida pelos próprios envoltórios (ko?as) e centros psíquicos sutis e a percepção muito mais nítida das próprias imagens mentais (pratyaya). É essa nítida percepção das imagens mentais (como em um sonho vívido) formadas que facilita a nossa concentração YS II:53 (dh?ra??) sobre elas, com conseqüente melhora em sua manipulação, com vistas à sua supressão.

O verdadeiro propósito de pr???y?ma é estar apto à obtenção do estado mental de praty?h?ra (abstração dos sentidos), essencial para o exercício da verdadeira concentração (dh?ra??). O canto e a oração, quando se tornam exercícios respiratórios, também podem ser formas de pr???y?ma, se levarem a mente a um estado totalmente absorto e introspectivo.


BIBLIOGRAFIA

  • As referências bibliográficas acham-se assim indicadas: xx:yy, onde ‘xx’ é o número da referência contido na BIBLIOGRAFIA (no final do livro) e ‘yy’ é a página onde se encontra.

  • Quando precedendo ‘xx’ estiver escrito YS, a obra referenciada é o Yoga S?tra de Pat?ñjal?, BG quando for Bhagavad G?t?, VC quando for o Viveka Ch?d?mani, TB quando for o Tattvabodha? e SS quando a obra referenciada for o ?iva S?tra (obra de referência no ?ivaísmo de Cachemira). Nesses casos ‘xx’ é o capítulo e ‘yy’ é o s?tra.

 

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