As corrupções do budismo
A intolerância do espírito judaico conservou a sua fé essencial, clara e limpa. A indiferença teológica dos grandes mestres orientais, nem assentindo nem negando, permitiu, pelo contrário, explanações e desenvolvimento e acumulações de ritual, desde o próprio começo. A não ser a insistência de Gautama por Idéias Certas ou Direitas, que foi facilmente esquecida, não havia nenhum elemento de preservação da pureza, de autopurificação, nas doutrinas do budismo, o tauísmo ou confucionismo.. Não havia nenhuma proibição eficaz de práticas supersticiosas, invocação de espíritos, encantações, prostrações e cultos suplementares. Cedo começou um processo de incrustação, que não findou mais. As novas crenças apanharam quase todas as doenças das religiões corrompidas que elas visavam substituir; aceitaram os ídolos e os templos, os altares e os incensórios.
O Tibete é, hoje, uma região budista, mas Gautama, pudesse ele voltar à terra, percorreria de uma ponta a outra toda a terra, buscando em vão a sua doutrina. Encontraria o mais antigo tipo de governo humano, um deus-rei, entronizado, o Dalai Lama, o “Buda Vivo”. ' Em Lhasa, encontraria um grande templo, repleto de sacerdotes, abades e lamas – ele cujos únicos edifícios eram as cabanas e que não fizera nem ordenara nenhum padre – e, no alto de um elevado altar, observaria atônito um imenso ídolo de ouro, que lhe diriam chamar-se “Gautama Buda” ! Ouviria serviços religiosos entoados ante essa divindade e certos preceitos, que lhe seriam longinquamente familiares, murmurados como respostas. Campainhas, incenso, prostrações teriam a sua parte nessas espantosas práticas. A um certo ponto do serviço, uma campainha tocaria e um espelho seria erguido, enquanto toda a congregação, em um acesso de súbita reverência, se curvaria longamente…
Em toda essa região budista, descobriria certo número de curiosos e pequeninos mecanismos, pequenos cata-ventos e moinhos d'água, sobre os quais se achavam inscritas breves orações. Cada vez que se rodam essas coisas, dir-lhe-iam, conta-se como uma oração. “A quem?”, perguntaria ele. Além disso, haveria certo número de mastros de bandeiras que traziam uma enigmática inscrição: “Om Mani padme hum”, só que como todo mantra adentrou para uma simples formulação mágica sem adentrar no seu profundo significado. Sem adentrarmos no sinergismo psíquico que já retratei em Mantras, mas o poder do som está mais para a vibração conciliada as emanações elétricas do cérebro humano. Sempre que se suspende uma bandeira, dir-lhe-iam, conta-se também uma oração, que é muito benéfica para o cavalheiro que pagou pela bandeira, como para a terra em geral. Bandos de trabalhadores, empregados por pessoas piedosas, estariam percorrendo o país, inscrevendo essa preciosa fórmula em rocha e pedra. E isso, compreenderia ele afinal, foi o que o mundo fizera de sua religião!
Debaixo dessa ostentação brilhante, foi enterrado o Caminho Ariano para a serenidade da alma.
Já observamos a falta de qualquer idéia de progresso no budismo primitivo. Nisso ele contrastava, de novo, com o judaísmo. A idéia de uma Promessa deu ao judaísmo uma qualidade que nenhuma religião anterior ou contemporânea apresentou; tornou o judaísmo histórico e dramático. Justificou a sua severa intolerância, porque visava um objetivo. A despeito da verdade e profundidade do lado psicológico da doutrina de Gautama, o budismo se estagnou e corrompeu pela falta dessa idéia diretora. O judaísmo, deve-se confessar, nas suas fases primitivas, mal entrou nas almas dos homens; deixou-as ficar cobiçosas, avarentas, mundanas ou supersticiosas; mas, em virtude de sua convicção de uma promessa e de uma direção divina para servir a fins divinos, conservou-se, em comparação com o budismo, expectante e luzente como a lâmina de uma espada bem cuidada. * Baseado em estudos da História Universal