Yamas

Satya

“Quem profere verdades que não ferem os outros… esse pratica tapas por palavras”. BG 17:15

Comumente considerada como veracidade ou sinceridade, satya inclui evitar todo e qualquer ato físico, emocional e mental de inverdade: ‘um uso benevolente das palavras e pensamentos’. Significa abster-se de todos os exageros, fingimentos, comportamentos dúbios ou evasivos e equívocos deliberados causados pela palavra proferida de forma impensada ou precipitada, ou quando se desconhece aquilo do que se está tratando. Tudo o que se diga a respeito de qualquer coisa deve ser a melhor aproximação racional que se pode alcançar da realidade do objeto do qual se está falando.

A criança começa a mentir como estratégia para conseguir o que ela deseja ou como mecanismo de defesa, para fugir de castigos, repreensões ou julgamentos: mente-se porque se tem medo. Mas como ela aprendeu que a mentira é algo repreensível, ela sempre vestirá uma máscara de verdadeira. A criança tem medo de perder o amor e o respeito dos pais por ela ter mentido e assim ela prossegue mentindo e dizendo que não mente.

Mentimos porque temos medo de não conseguir o que queremos ou perder o que já temos. Mentimos porque temos medo do julgamento, medo de sermos excluídos da sociedade, medo de nos tornarmos alguém inferior ante os iguais. Mentir e procurar meios de manter a mentira, com mais justificativas falsas (outras mentiras), exige muito gasto energético pessoal. E o mecanismo segue como uma avalanche, envolvendo outras pessoas, muitas vezes inconscientemente, para manter uma simples mentira.

Atualmente vemos a mentira quase como uma virtude. Quem não engana aos outros não é esperto e não pode ser incluído entre os poderosos, ricos e famosos: meta atual de nossa sociedade. Mente-se como se fosse uma prática saudável da mais nobre virtude. Somos levados como marionetes por um sistema social excludente que separa e divide pobres e ricos, famintos e abastados. Assim, muitas vezes oprimimos e mentimos a nós mesmos quanto aos nossos verdadeiros sentimentos, desejos e ideais, para podermos continuar participando e sendo aceitos como pertencentes à sociedade: o velho medo infantil de perder o respeito, amor e admiração dos entes queridos. Agredimo-nos para não agredir àquele sistema social excludente fadado à extinção, em que se está imerso.

Embora a mentira seja produzida, inicialmente, como mecanismo de proteção ante uma sociedade que critica, julga oprime e condena, ela fomenta a falsidade, a corrupção, o roubo e o assassinato. Mas a mentira não é uma expressão exclusivamente negativa, pois algumas vezes ela é necessária e imprescindível, na sua forma de omissão da verdade, quando for para proteger e cuidar. Satya nunca deve ir contra ahi?s?. Não dizer a verdade a alguém, ainda não preparado psicologicamente, sobre uma doença fatal própria ou de um parente próximo, ou não revelar o paradeiro de uma pessoa a um pretenso assassino, passam a ser ações virtuosas BG 17:15, pois embutem sentimentos de compaixão e de cuidado (a prática de ahi?s?), e não de medo e cobiça.

Antes de tudo deveríamos constantemente ‘vigiar e orar’. Vigiar no sentido de tornarmo-nos conscientes de todos os nossos pensamentos, palavras e ações, detectar inclinações e hábitos e, se tivermos que mentir, fazê-lo conscientemente, cientes de todas as conseqüências desse ato. E orar no sentido de pedir proteção e discernimento ao Si-mesmo ou a um Poder Superior, quanto à decisão correta em momentos cruciais.

Podemos mentir, mas nunca mentir porque é socialmente recomendável. Podemos mentir, mas nunca para auferir lucros pessoais, em qualquer nível (psicológico, emocional ou material). Podemos mentir, mas nunca porque nos sentimos inferiores. Podemos mentir, apenas porque somos imperfeitos e reconhecer a falha procurando vigiar-se mais intensamente. Podemos mentir, apenas porque ainda não entramos em contato pessoal com Aquela Fonte inesgotável de sabedoria e de discernimento que temos em nosso interior. Podemos mentir, apenas porque ainda não encontramos Deus…

Aqui, novamente, a auto-observação constante, o correto esforço para alcançar satya e o desenvolvimento do discernimento que dita como deverei agir em cada situação, constituirão o tripé básico que proverá um solo fértil para o florescimento de satya. Com essa prática constante, começamos a aproximar nosso pequeno eu de nossa fonte mais interna de sabedoria, que Pat?ñjal? chama de buddhi YS IV:22, e com buddhi desperto todas as palavras passam a refletir cada vez mais a Verdade presente na Mente Divina. Desse ponto de vista, adquire-se um conhecimento tal que se pode antever uma possibilidade real de retorno às próprias palavras e pensamentos: materializá-los.

Por isso, quanto mais perfeito em satya o buscador se torna, mais ele gera correntes magnéticas sutis de veracidade a ponto de transformar suas próprias palavras e pensamentos (desejos e vontades) em verdades. Ou seja, tudo o que se pensa automaticamente se torna realidade: adquire-se o poder de conquistar os frutos do trabalho sem realizar o trabalho, pois sua vontade agora é poder espiritual YS II:36. Tudo o que disser será, desde que não haja contradição com as leis naturais. Não mais se procura por nada, pois tudo o que se deseja vem ao encontro do buscador. Com satya vem o destemor e passa-se a não mais ter medo de nada nem ninguém.

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