A Especificidade dos Sites Receptores
Existe um campo na psicologia onde a mente pelo menos a consciência tem sido estudado objetivamente por cerca de vinte anos. É o campo da psicofarmacologia onde pesquisadores desenvolveram formas altamente rigorosas para medir os efeitos das drogas e estados alterados de consciência.
A pequisa nesse campo evoluiu à partir da suposição de que nenhuma droga age se não for ‘fixada’, isto é, ficar de alguma forma agregada ao cérebro. Portanto os pesquisadores inicialmente imaginaram constituintes de tecidos hipotéticos aos quais uma droga poderia aderir de forma semelhante ao encaixe de uma chave no trinco e os denominaram ‘receptores’. Desta maneira, a noção de receptores cerebrais específicos para drogas tornou-se uma teoria central na farmacologia. A idéia é bastante antiga.
Nos anos recentes, um desenvolvimento crítico foi a inveção de novas tecnologias para realmente aderir as drogas a essas moléculas receptoras e para estudar tanto sua distribuição no cérebro e no corpo como sua própria estrutura molecular.
Meu trabalho inicial nessa área foi no laboratório de Solomon Snyder na Universidade John Hopkins, onde focamos a atenção no ópium, uma droga que obviamente altera a consciência e também é utilizada na medicina para aliviar a dor. Trabalhei intensamente por muitos meses de insucessos iniciais para desenvolver um sistema técnico de medir o material no cérebro que interage com o ópium para que ele produza efeito. Encurtando uma longa (e técnica) história, usamos moléculas de drogas radioativas, e com essa tecnologia conseguimos de fato identificar o elemento receptor para o ópio dentro do cérebro. Podemos imaginar, portanto, uma molécula de ópium agregando-se a um e daí, dessa pequena conexão, grandes mudanças se seguem. Em seguida constatou-se que toda a classe de drogas à que pertence o ópium, denominada opiatos, que inclui morfina, codeina, e heroína, aderem aos mesmos receptores. Além disso descobrimos que os receptores estavam espalhados não somente no cérebro mas em todo o corpo. receptor
Após a descoberta dos receptores para opiatos externos, nosso pensamento deu mais um passo. Se o cérebro e outras partes do corpo têm um receptor para algo externo ao corpo, faz sentido supor que algo produzido dentro do próprio corpo também se encaixe no receptor. Outrossim, porque o receptor estaria alí?
Essa perspectiva enfim levou à identificação de uma das formas de opiatos do próprio cérebro, uma substância química chamada beta endorfina. A beta endorfina é criada nas células nervosas do próprio cérebro e consiste de peptídeos, portanto é um neuropeptídeo. Além do mais, peptídeos nascem diretamente do DNA que armazena a informação que faz nossos cérebros e corpos.
Se imaginarmos uma célula nervosa comum, podemos visualizar o mecanismo geral. No centro (como em qualquer célula) está o DNA, e um demonstrativo impresso direto do DNA leva à produção de um neuropeptídeo, que em seguida se transporta pelos axônios da célula nervosa para ser armazenada em pequenas bolinhas nas extremidades aguardando os eventos eletrofísicos que irão liberá-lo. O DNA também leva à produção de receptores, que são formados do mesmo material peptídido mas são bem maiores. O que temos a acrescentar à esse quadro é o fato de ter sido identificados de 50 a 60 neuropeptídeos, cada um tão específico quanto o beta endorfina. Temos aqui um sistema imensamente complexo.
Até bem recentemente, pensava-se que a infromação dos sistemas nervosos era distribuída através do gap (espaço vazio) entre duas células nervosas, denominado sinapse. Isso significava que a proximidade da célula nervosa determinava o que poderia ser comunicado.
Mas agora sabemos que a maior parte da informação proveniente do cérebro é mantida em ordem não pela justaposição física de proximidade das células nervosas mas pela especificidade dos receptores. O que pensávamos ser um sistema linear altamente rígido, revela-se possuidora de modelos muito mais complexos de distribuição.
Portanto, quando uma célula nervosa emite peptídeos opiáticos, eles podem atuar há ‘quilometros’ de distância de outras células nervosas. O mesmo se aplica a todos os neuro peptídeos. A qualquer dado momento, muitos peptídeos podem estar flutuando pelo corpo e o que possibilita que eles se acoplem às moléculas receptoras corretas é, repetindo, a especificidade dos receptores. Portanto, os receptores servem como mecanismo para selecionar a troca de informações dentro do corpo.